21/02/2020 – As gerações sucedem-se sem que a evolução de uma para a próxima seja óbvia. Será que o automóvel tradicional já não tem por onde melhorar?

 

No passado não muito distante, quando um modelo passava de uma geração para a seguinte, a lista de evoluções era sempre muito significativa.

Geralmente acontecia uma de duas coisas, ou a plataforma era totalmente nova, ou isso acontecia com a família de motores.

Em poucos casos as duas evoluções ocorriam ao mesmo tempo, pois implicavam investimentos muito avultados, que os construtores não tinham maneira de amortizar de uma só vez.

Mas os números mais importantes que eram anunciados, revelavam melhorias significativas.

As eras de evolução

Tivemos a era da aerodinâmica, com os valores de Cx a cair consecutivamente.

Tivemos a era da segurança passiva, com novos sistemas a diminuir drasticamente as consequências de um acidente.

Depois tivemos também a era da redução dos consumos, do fenómeno Diesel, que reduziu imenso a quantidade de combustível queimado pelos motores.

É verdade que, nos últimos tempos, o caso Dieselgate veio manchar a reputação dos motores a gasóleo. Mas o que continua por desmentir é que o Diesel é o motor que consome menos combustível fóssil e menos dióxido de carbono emite para atmosfera.

Se está a pensar que o problema são os NOx, consulte os valores de emissões destes compostos que os mais recentes motores Diesel emitem e vai ter uma surpresa.

O Alumínio falhou

Mas voltando às evoluções mais recentes, também passamos pelos novos materiais, primeiro com a promessa não cumprida da passagem para o Alumínio, de que o Audi A2 ficará como um atestado de óbito.

Contudo, o desenvolvimento de aços de alta, ultra e super resistência veio modificar a maneira como os automóveis são construídos.

A utilização de chapa de secção diferente, consoante os esforços locais de cada parte da estrutura, a estampagem a quente e a utilização de super-adesivos vieram aumentar a relação entre a rigidez e o peso.

A popularização dos vários tipos de caixas automáticas, com as de variação contínua e de dupla embraiagem à frente, foi outra evolução relevante, tal como a simulação informática da cinemática das suspensões. Os carros são hoje mais confortáveis e muito mais eficazes.

Mas a verdade é que, nos últimos anos, este tipo de evoluções de “hardware” desacelerou consideravelmente.

Hoje, é comum que uma plataforma seja usada para várias gerações de um mesmo modelo, diluindo o próprio conceito de geração.

E já nem falo dos motores, que se perpetuam, apenas com as modificações obrigatórias para se manterem dentro ou perto das metas de emissões poluentes.

Conetividade e ajudas à condução

As grande evoluções dos nossos tempos são a conetividade, que nada tem a ver com o automóvel em si e cuja relevância ainda está por provar, tendo em conta a maneira como os condutores continuam agarrados ao seu smartphone.

E a outra grande evolução são as ajudas eletrónicas à condução. Algumas inúteis, outras incompetentes e muito poucas realmente válidas.

Chegámos então ao topo da escada, ao limite superior da evolução do automóvel convencional?

A resposta a esta pergunta não é fácil, mas podemos encontrar algumas pistas para lhe dar uma resposta.

A primeira é a questão das prioridades. A indústria automóvel está numa fase de viragem acentuada, devido aos novos limites de emissões poluentes que lhe são exigidos.

O investimento vai todo para a resolução urgente do problema, pois é sabido que, os modelos que não cumpram os novos limites vão ter que pagar multas.

A maior parte do investimento está a ser canalizado para esta emergência, mas os construtores que estão mais encostados à parede não podem acusar apenas a classe política do que lhes está a acontecer.

A verdade é que todos os construtores já tinham uma ideia mais ou menos precisa daquilo que os esperava, há uns dez anos.

Mas decidiram empurrar o problema com a barriga e agora estão com o “menino nos braços”, como se costuma dizer.

Hibridização leva tudo

A maioria dos construtores está tão ocupada a lançar modelos híbridos, semi-híbridos e “plug-in” que não tem tempo para pensar em mais nada. Nem dinheiro.

Os que têm alguma folga orçamental, preferem saltar já para o passo seguinte e colocar no mercado automóveis 100% elétricos.

Mesmo se os preços que praticam são inconcebíveis para a maioria dos compradores ou se a rede pública de carregamento é pouco mais do que insignificante.

Elétricos = progresso?

Pensar que os carros elétricos são um progresso, enquanto automóveis, face aos melhores modelos com motor de combustão interna só pode ser uma desatenção.

O peso das baterias, tanto em termos reais na estrutura dos automóveis elétricos, como em termos figurados, no custo total do veículo, anula qualquer veleidade de fazer progredir o automóvel noutras áreas.

A realidade é que os automóveis elétricos, na sua maioria, são apenas adaptações apressadas de um conceito com 100 anos de idade.

Quando se começou a falar da eletrificação do automóvel, os principais projetistas afirmavam que se tratava de uma oportunidade única para reformular o conceito base do automóvel de venda em massa: motor à frente, habitáculo ao meio e mala atrás.

Diziam os mais ousados que nada disso tinha que ser assim, quando a bateria se iria colocar sob o piso e os motores elétricos, muito mais pequenos, iriam para perto das rodas.

Poucos carros elétricos exploraram estas novas possibilidades. Alguns construtores começaram a desbravar caminho, mas acabaram por voltar para trás, caso da BMW com o i3.

O efeito SUV

E se pensarmos no estilo, então o progresso é ainda mais difícil de perceber. Enquanto a evolução do desenho da carroçaria esteve intimamente ligado ao progresso da aerodinâmica, era fácil perceber de onde um modelo vinha e para onde ia.

Hoje, numa era em que os SUV estão a tomar de assalto todos os segmentos de mercado, até a aerodinâmica, origem de progresso claros nos consumos e emissões, está a ser deixada para segundo plano. O estilo passou a ser mais decorativo que funcional.

Conclusão

Volto à pergunta do início: chegamos ao topo do desenvolvimento do automóvel, tal como o conhecemos há 100 anos? Provavelmente sim. Ou pelos menos estamos numa fase de estagnação, enquanto a transição energética não ganha tração e se alarga a uma percentagem relevante do mercado.

Francisco Mota

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