1/12/2023. Foi o modelo que mais cabelos brancos trouxe aos administradores da Tesla. A pick-up Cybertruck começou finalmente a ser entregue aos clientes nos EUA, com dois anos de atraso e preços 50% acima do anunciado inicialmente. Que efeitos isto poderá ter na marca é o tema da Crónica à 6ª feira do TARGA 67, assinada por Francisco Mota.

 

Esta semana, a Tesla entregou as primeiras unidades da pick-up Cybertruck a clientes Norte-Americanos, mas em vez de subir, a cotação da empresa em Bolsa deu um trambolhão de 2%. Num só dia, o valor da companhia desceu 15 mil milhões de dólares.

Claro que, quando falamos da Bolsa, estamos a falar de expetativas e não de valores reais. Se a Tesla conseguir resistir às dificuldades do lançamento da Cybertruck, o mais certo é que recupere. Entretanto, mais alguns investidores vão fazer uns milhões de lucro.

Mais importante que a flutuação bolsista é saber as razões para este safanão no percurso da Tesla. A Cybertruck foi apresentada ao público há quatro anos, num evento que não correu bem. Ao querer demonstrar a resistência dos vidros a um impacto de uma bola de aço, a experiência falhou e o vidro esmagou.

“Para qualquer planeta”

Mas isso foi apenas um “fait-divers” na história do lançamento da pick-up anunciada como tendo uma construção “preparada para qualquer planeta”, numa referência à carroçaria em aço inoxidável.

As dificuldades técnicas em colocar tudo em estado de ser vendido foram muitas e o programa atrasou dois anos. A Tesla terá aprendido muito com este projeto, mas é difícil estimar quando dinheiro “queimou”, usando uma expressão de Musk.

A prova disso é que, quando o modelo foi finalmente apresentado esta semana, foi com espanto que os analistas constataram que os preços de venda ao público estavam 50% acima daquilo que o CEO da empresa, Elon Musk, tinha anunciado em 2019.

Não foi a primeira

Além disso, a Cybertruck perdeu o argumento de ser a primeira pick-up elétrica a chegar ao mercado Norte-Americano, sendo batida por várias outras rivais, com destaque para a Ford F150 Lightning, Rivian R1T e Hummer EV.

Mas as dificuldades não se ficam por aqui. Segundo analistas independentes citados pela Reuters, a Tesla não vai conseguir entregar mais de 75 000 unidades da Cybertruck em 2024, sendo pouco verosímil que o objetivo inicialmente avançado por Musk de 250 000 unidades a partir de 2025 venha a ser cumprido.

A Tesla parece até ter mudado de estratégia em relação à Cybertruck, afirmando agora que não se trata de um produto de volume, mas de um modelo de topo que servirá como locomotiva das vendas da restante gama.

Gama insuficiente

A Cybertruck foi o primeiro modelo novo lançado pela Tesla nos últimos quatro anos, se excluirmos os restylings aplicados à sua atual gama. Se um catálogo de quatro modelos tem a vantagem de ser fácil de gerir, também tem o problema de não cobrir todo o mercado.

Neste momento, a Tesla é das marcas com menos modelos elétricos disponíveis e isso pode ser um problema a curto prazo. Espera-se pelo Model 2, um elétrico do segmento do VW Golf que será feito em Berlim e com preço anunciado de 25 000 euros. Mas ainda não há muitos detalhes.

Sonho virou pesadelo?

Segundo a Reuters, o dinheiro gasto na Cybertruck poderá impedir a Tesla de retirar algum lucro nas vendas desta pick-up, pelo menos nos próximos anos.

Há vários casos na história do automóvel em que um único modelo causou grandes danos à saúde financeira do seu construtor. O Ro80, uma berlina de luxo com motor rotativo lançada nos anos sessenta, é geralmente apontada como a causa para a falência da marca alemã NSU.

Os problemas com o motor idealizado por Felix Wankel levaram a demasiados acionamentos de garantias, que acabaram com as finanças da empresa, depois vendida à Audi. Poderá a Cybertruck ter igual efeito na Tesla?…

Muito complexa

Talvez a marca americana tenha exagerado na complexidade da sua pick-up elétrica, num segmento em que a simplicidade tem sempre dado os melhores resultados.

Além da carroçaria em aço inoxidável, um quebra cabeças em termos de produção, a Tesla utiliza soluções complexas como a direção “by wire”, direção às quatro rodas, suspensão pneumática e até três motores elétricos.

Três versões na gama

A gama começa pelo topo, com uma versão Cyberbeast de três motores e 857 cv, capaz de acelerar dos 0 aos 100 km/h em 2,7 segundos e com autonomia de 512 km. O preço anunciado nos EUA é de 99 900 dólares.

A versão de dois motores All-Wheel Drive tem 608 cv, acelera dos 0 aos 100 km/h em 4,1 segundos e tem 544 km de autonomia, custando 79 990 dólares.

Estas são as duas versões de lançamento, em 2025 chegará uma versão Rear-Wheel Drive de tração apenas às rodas de trás com 400 km de autonomia, 0 a 100 km/h em 6,5 segundos mas potência ainda não anunciada, com um preço de 60 990 euros.

Por comparação, a Ford F150 Lightning AWD de 512 km de autonomia e 0-100 km/h em 4,0 segundos, custa 49 995 dólares.

Extensor de autonomia

Quanto à capacidade da bateria, ainda não há dados oficiais, mas um concessionário da marca terá dito a um site especializado que a versão base tem 123 kWh de capacidade. O que é oficial é que existirá um extensor de autonomia.

Não se assustem os seguidores da Tesla que a marca não vai ter um motor térmico a gerar energia. O extensor de autonomia é uma segunda bateria que pode ser montada na caixa de carga, ocupando um terço do espaço disponível e que aumenta a autonomia em 208 km, na AWD e em 192 km, na Cyberbeast.

Conclusão

Com estas características, é óbvio que a Cybertruck não é um veículo de trabalho, como a maioria das pick-up vendidas nos EUA. Resta saber se não terá levado demasiado longe tanta complexidade, que lhe atirou o preço para valores muito altos, sobretudo para aquilo a que o mercado doméstico está habituado. A questão que se coloca é: será que a Tesla precisava mesmo da Cybertruck? Ou é apenas mais um fruto do ego de Elon Musk?

Francisco Mota

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