4/11/2022. Proposta em Julho de 2021, a lei que prevê o fim dos motores a combustão em 2035 vai mesmo em frente, depois de o Parlamento Europeu e o Conselho Europeu terem chegado a acordo. Agora, não há volta atrás. Vai ser o fim de uma era.

 

É preciso aprender um pouco sobre a organização da União Europeia (UE) para perceber melhor o que está em causa com este anúncio, ao estilo “agora é que é!”

Em julho de 2021, a Comissão Europeia (CE) fez uma proposta de lei que previa a proibição da venda de carros que não tivessem emissões locais zero de CO2, a partir de 2035.

Seguiu-se mais de um ano de negociações entre os representantes do Parlamento Europeu (PE) e o Conselho Europeu (CE…2?… já estou a ficar sem siglas) onde estão representados os chefes dos governos dos 27 países da UE.

Tanto o Parlamento Europeu, como o Conselho Europeu têm que aprovar as leis propostas pela Comissão Europeia, para resumir o funcionamento da “máquina”. A votação da lei no Parlamento Europeu é uma formalidade, após este acordo.

Negociação chegou ao fim

Essa negociação chegou agora ao fim, com um acordo que não trouxe surpresas. Os fabricantes de automóveis estão proibidos de vender carros que não sejam de emissões zero locais a partir de 2035.

Nas palavras do porta-voz do PE, “uma redução de 100%” nas emissões de CO2, locais, ou seja, as libertadas pelo próprio automóvel.

Pelo caminho, em 2030, terá que haver uma redução de 55%, face aos valores de CO2 de 2021, na prática obrigando a maioria dos carros a passar a híbridos antes dessa data, quando o valor que tinha estado na mesa até agora era de 37,5%.

Acordo histórico

O porta-voz da UE disse que se tratava de um acordo histórico e que “os carros elétricos vão ficar mais baratos e acessíveis” por causa dessa lei. Nada disse sobre investimentos na rede de carregadores públicos.

Mas foi garantido que haverá mais ajudas aos compradores e aos fabricantes, para que o setor dos transportes atinja a neutralidade carbónica na Europa até 2050.

Curiosamente, no Reino Unido pós-Brexit, esses incentivo vão acabar em janeiro próximo, pois conclui-se que os compradores dos atuais carros elétricos não precisavam de ajuda.

Mais CO2 nos transportes

Foi também dito que o setor dos transportes foi o único, na Europa em que as emissões de CO2 cresceram nos últimos 30 anos.

Olhando para a deslocalização da indústria para fora da Europa e para o aumento das vendas de automóveis nos últimos 30 anos, não é nada que surpreenda.

Vai haver exceções

A UE deixou a promessa de que a Comissão Europeia vai fazer mais uma proposta de lei relativa à vida dos carros que “consumam combustíveis com CO2 neutro”, após 2035, sem dar mais detalhes. Os chamados combustíveis “verdes” e o Hidrogénio são os visados.

Outro asterisco da lei diz respeito aos fabricantes que produzem menos de 10 000 carros por ano. Ou seja, uma evolução da chamada “lei Ferrari”.

Ficou para estudar um regime em que não sejam obrigados a cumprir objetivos tão apertados, pelo menos até 2036. Mas depois têm que alinhar com os outros.

Hipercarros a gasolina?!…

Tendo em conta a evolução a que estamos a assistir já hoje, com o lançamento de vários superdesportivos elétricos, parece-me que a realidade tornará este detalhe da lei totalmente obsoleto muito antes de 2036.

Dentro de pouco tempo, nenhum cliente de uma marca de elite vai querer ouvir falar de motores a combustão, muito menos ser visto dentro de um “fumarento”, como alguns já lhe chama. O que, aliás, já está a acontecer com os endinheirados clientes mais novos.

“Devia ser já em 2028”

A Greenpeace já veio dizer que a lei é tardia, que “deveria entrar em vigor já em 2028” e que só mostra a incompetência dos políticos em resolver o problema nas últimas décadas. Dos tradicionalmente radicais desta organização, não seria de esperar outra coisa…

Mas o que poderá acontecer com a entrada em vigor desta lei, agora sem margem para dúvidas e sem margem para grande negociação?

Em primeiro lugar, é bom lembrar que se trata de uma lei apenas para a Europa, que não é a principal região consumidora de automóveis. Depois, vários cenários são possíveis.

O que pode acontecer

Parece-me claro, até pelo contato diário que tenho com muitos consumidores, que a aceitação do conceito do carro elétrico vai acelerar ao ritmo dos seus próprios motores nos próximos anos.

Resta saber se essa vontade crescente de aderir ao movimento elétrico poderá ser consumada, tendo em conta os preços elevados que os EV têm, por enquanto.

O anúncio de mais incentivos estatais para baixar os preços artificialmente poderá chocar com questões sociais básicas: porquê gastar o dinheiro dos impostos na fórmula do carro individual elétrico, em vez de promover os transportes coletivos elétricos e gratuitos?…

Quem vier atrás…

Com esperança média de vida (política) tipicamente de quatro anos, os dirigentes que agora aprovam esta lei, há muito que estarão longe do poder quando os seus sucessores a tiverem que pôr em vigor. E isso poderá levar a alterações, se as coisas não correrem como esperam.

E há muito por onde este plano pode correr mal, sobretudo no que diz respeito à evolução da rede de carregadores, sobretudo os lentos, para carregamentos durante a noite, de que quase já ninguém fala.

O carregamento rápido tornou-se numa nova corrida, para ver quem carrega mais depressa a bateria, esquecendo-se que isso diminui a vida das baterias e que faz subir o preço da própria recarga.

É possível que novas tecnologias de baterias resolvam a primeira questão, quanto à segunda, tenho mais dúvidas. O negócio tem demasiado potencial para não crescer e subir ainda mais o preço.

Conclusão

A UE diz que esta é uma de várias leis que vai produzir para diminuir as emissões de CO2 no espaço europeu, no que à área da mobilidade de pessoas e bens diz respeito. Espero com curiosidade para ver quais vão ser as próximas, mas não deixo de registar que o automóvel continua a ser o alvo preferencial da classe política.

Francisco Mota

Ler também, seguindo o LINK:

Crónica – Ursula “mata” motores a combustão em 2035