Ursula von der Leyen, a presidente da Comissão Europeia

Produção de motores a combustão tem mais de um século

Fábricas de motores a combustão têm os dias contados

É preciso investimento público na Europa para fábricas de baterias

As fábricas de automóveis elétricos precisam de menos trabalhadores

Maior robotização vai criar desemprego

Paridade de custos entre elétricos e combustão em 2025

16/7/2021. A Comissão Europeia anunciou um aperto na redução de emissões dos automóveis, que torna impraticáveis os motores de combustão a partir de 2035. Mas não será tudo isto um teatro, para que ninguém fique mal na fotografia?

 

Promovida antecipadamente através de fugas cirúrgicas da informação que seria oficialmente divulgada, a conferência desta semana da Comissão Europeia voltou a abordar o tema da neutralidade carbónica no espaço europeu em 2050.

Pensar que um grupo de políticos tem a veleidade de estabelecer um plano a trinta anos, pode ser interpretado como pretensão ou como visão. Muitos políticos virão depois destes, novas fornadas a cada quatro anos, todos vão ter que subscrever este plano. Ou não.

O plano abrange toda a atividade humana geradora de CO2 na Europa, na qual os transportes rodoviários têm 12% da “culpa” diz a CE. Mas a indústria automóvel sempre foi um alvo fácil para políticos e todo o tipo de grupos de pressão, verdes ou vermelhos.

Apertar nas emissões

Por isso, a sua atual presidente, a muito bem penteada (espero não estar a ofender nenhuma minoria…) Ursula von der Leyen anunciou que, afinal, as reduções que estavam previstas para 2030, vão ser mudadas. No sentido de uma maior exigência, claro.

Posto em números, até agora estava dito que, entre 2021 e 2030, a indústria automóvel teria que diminuir em 37,5% a média das emissões dos carro novos vendidos ao público.

Agora, essa diminuição passou a ser de 55%, para o mesmo período. Ou seja, daqui a nove anos, a média das emissões dos carros vendidos novos tem que ser menos de metade da que temos hoje.

PHEV em causa

Esta alteração poderá pôr em causa a existência dos “plug-in”, uma tecnologia que, dizem os construtores, exigiu grandes investimentos e que, assim, não terá um ciclo de vida suficientemente longo para ser rentável.

Bem ao seu estilo, a ACEA (associação dos construtores europeus de automóveis) reagiu com uma declaração tardia e inútil, ao dizer que os motores de combustão interna têm ainda um papel nesta fase de transição.

Mas a CE foi mais longe e afirmou que é fundamental que se defina uma data para que todos os automóveis novos vendidos na UE tenham emissões zero. E definiu 2035 como meta.

É só política

É mais uma daquelas declarações políticas que fica bem nos títulos dos jornais e agrada à maioria dos consumidores. Mas, pessoalmente, parece-me esvaziada de conteúdo: daqui a 14 anos, não acredito que alguma marca de automóveis ainda esteja a produzir motores de combustão interna para vender na Europa.

Por dois motivos. O primeiro é que, está estimado pelos construtores, que os custos de produção de um carro elétrico e de um a combustão vão encontrar o ponto de equilíbrio em 2025. Daí para diante, será mais barato construir carros elétricos.

O segundo motivo é ainda mais fácil de entender. Basta olhar para a aceleração que o tema da transição energética tem ganho nos últimos meses e anos para perceber que, daqui a 14 anos já a realidade será muito diferente. Pense onde estamos hoje, e onde estávamos há 14 anos.

Elétricos não são obrigatórios…

A ACEA reage com mais um argumento fora de tempo: que a CE não devia impôr uma tecnologia (a dos carros elétricos) mas deixar aos engenheiros a procura de uma solução para chegar à neutralidade carbónica.

A senhora Leyen antecipou-se e disse que sim, que “os construtores é que sabem que solução podem encontrar” como se a CE não tivesse feito tudo para encarreirar a indústria para os veículos elétricos.

Os construtores, em paralelo à ACEA, dizem que sim, que concordam com os carros elétricos ( pudera! Já investiram neles milhares de milhões de euros…) mas que querem uma contrapartida dos Estados europeus.

Mais investimento público

A contrapartida é um investimento dos Estados na construção de mais postos de abastecimento de energia para os futuros carros elétricos. Como esta atividade não parece ser ainda um negócio atraente (com a eventual exceção dos carregadores rápidos) vai ter que ser apoiada por incentivos públicos.

A CE concorda e avança com a ideia de “obrigar” os seus Estados membros a financiar a instalação de postos de carga de carros elétricos. O que está em cima da mesa é uma rede que cubra as estradas principais de cada país, com a condição de não haver mais de 60 km de distância entre dois pontos de carregamento.

Os cálculos indicam um custo entre os 80 e os 120 mil mlhões de euros, só até 2025, com projeções a estimar a existência de 3,5 milhões de postos em toda a Europa, até 2030, subindo para 16,3 milhões, em 2050.

Alemanha e França torcem o nariz

O lóbi “verde” bate palmas, diz que este foi “um dia histórico e que agora os carros elétricos vão ficar acessíveis a todos” e que o clima vai arrefecer. O mais puro idealismo é assim.

Mas alguns Estados membros não estão a gostar da conversa. A França já disse que apoia a redução de 55% para 2030, mas exige uma extensão de vida para os PHEV. Adivinhe quem lhe sussurrou isso aos ouvidos…

A Alemanha diz que a aposta não pode ser só nos elétricos, que os combustíveis alternativos têm um papel e que tem de haver uma diferenciação entre veículos ligeiros e pesados: baterias para os primeiros, e Fuel Cell, para os segundos. Quem lhes terá passado o sermão?

Desemprego à vista

Não é por acaso que a França e Alemanha foram os primeiros a reagir a Bruxelas. São países onde a indústria automóvel tem muito peso, na economia e na estabilidade social.

Por isso, os dois países avisam que o desemprego gerado pela passagem da produção de automóveis com motores de combustão interna, para automóveis com motores elétricos vai gerar muito desemprego. Os segundos são mais simples de produzir e precisam de menos mão de obra.

Só que, os carros elétricos precisam de baterias e as baterias devem ser feitas o mais próximo possível das fábricas dos automóveis que vão equipar, pois são pesadas e o seu transporte é caro.

E ainda mais investimento público

Mas para isso, é preciso construir as fábricas de baterias o que, pelo que se tem visto nos últimos tempos, vai obrigar a mais investimento público. A iniciativa privada europeia parece não ter “arcaboiço” para entrar na inevitável “guerra” com os fabricantes chineses que dominam esse setor.

Uma coisa é certa, esse investimento teria duas vantagens: criar empregos que poderiam compensar os perdidos pelo fim dos motores de combustão interna; e evitar a dependência na China no fornecimento de células de baterias.

O elefante na sala

Claro que continua a não se falar do “elefante na sala”. Enquanto se elegem as emissões de CO2 e o aquecimento global como a nova cruzada, ninguém quer falar do assunto que realmente obriga a CE a combater a presença de automóveis poluentes no meio das cidades.

O problema de saúde pública diretamente relacionado com a qualidade do ar das nossas cidades é a verdadeira razão para toda esta transferência energética.

Conclusão

É uma razão urgente e vital. Só que de comunicação difícil para a população, pois teria que passar pelo abate em massa dos carros velhos e poluentes, os únicos a que muitos condutores conseguem chegar. Mas isso fica para outra crónica, ou pode ler um pouco sobre o assunto numa que escrevi há alguma tempo, seguindo o link abaixo. Até para a semana!

Francisco Mota

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Poluição: são os carros que nos matam?