02/10/2020. Para alguns, o conceito de “car sharing” parecia uma grande ideia, mas a prática veio mostrar as debilidades do sistema. As empresas do ramo estão a fechar e a culpa não é da Covid-19. Saiba por que razão deixou de ver na rua carros com os logotipos “drive now” ou “Hertz 24”.

 

O conceito de “car sharing” parecia uma boa ideia, no papel. As empresas interessadas colocavam na rua uma frota de automóveis a que o utilizador tinha acesso através de uma App e de uma chave digital, para abrir as portas e ligar o carro. Depois era só pagar os minutos utilizados, também via digital.

Assim, cada carro seria usado o máximo de tempo possível durante o dia, evitando o fenómeno do “estacionamento eterno.” Segundo dados conhecidos, depois de ser comprado, um automóvel passa 96% da sua vida parado.

E não por estar avariado, mas simplesmente porque o proprietário só precisa dele durante algumas horas por dia. No resto do tempo está estacionado, muitas vezes a pagar parqueamento.

Bom para a cidade

O “car sharing” era também uma maneira de reduzir o número de carros na cidade: em vez de comprar carro, bastava alugar um durante os minutos necessários por dia e assim, reduzia-se a quantidade de carros na cidade.

Era também uma maneira de reduzir os problemas de estacionamento e até a poluição, para os observadores mais otimistas. Na prática, nada disso se veio a verificar.

Antes que fique a pensar que o problema é a Covid-19 e a falta de vontade de qualquer um de nós em partilhar seja o que for com desconhecidos, posso dizer que o negócio já estava mal antes de Março de 2020.

A ideia provou não se adaptar às vontades dos utilizadores e as causas são muito fáceis de perceber. Desde logo, a disponibilidade de automóveis estava longe de ser uma garantia, quando se precisava de um.

As razões do falhanço

Depois, o estado de limpeza, ou falta dela, em que ficavam depois de serem usados por vários clientes. A logística de os limpar com regularidade era demasiado pesada, tal como o abastecimento de combustível.

Mas os problemas não terminaram aqui. Como é lógico, a maioria dos utilizadores precisa de um carro às mesmas horas que os outros, as horas de ponta, por isso a disponibilidade é sempre complicada.

Para facilitar a logística, algumas empresas começaram a estabelecer pontos de recolha e de entrega fixos, o que vai contra a essência da ideia original. Mas, nesta altura de pandemia, é a única hipótese de garantir a desinfeção do habitáculo.

A nível das cidades, as frotas de carros em “car sharing” não pagam parqueamento, as autoridades locais negoceiam o parqueamento com as empresas e o cliente acaba por pagar isso no “tudo incluído” do contrato.

Na prática, as cidades em que estas empresas funcionam, ficaram sem um determinado número de lugares de estacionamento para os utentes comuns.

Empresas a fechar

Não espanta que o negócio tenha começado a correr mal, desde logo nos EUA e Canadá, onde a procura desceu tanto que grandes empresas do ramo atiraram a toalha ao chão.

Foi o caso da Zipcar, propriedade da companhia de aluguer Avis, ou de outras menos conhecidas como a Communauto e Turo. Bem mais conhecida, a Maven, propriedade da GM, foi encerrada em Março deste ano, tendo durado apenas quatro anos no mercado.

Também a Share Now, que associa a BMW e a Daimler, encerrou as suas operações na América do Norte. Aliás, este ano também fez o mesmo em Lisboa.

Drive Now desapareceu

Se deixou de ver na rua os Mini e BMW com as siglas Drive Now, foi porque a empresa se juntou no referido consórcio Share Now da BMW e Daimler e resolveu sair de Lisboa.

A empresa tinha uma frota de 211 carros em operação, mas ao fim de três anos decidiu que Lisboa não era rentável para o seu negócio. E se pensa que isto é um problema de portugueses, fique a saber que a empresa já tinha fechado a atividade em Londres, Bruxelas e Helsínquia.

Quem quiser usar o “car sharing” em Lisboa, tem agora apenas uma empresa em atividade, a e-mov da Free2Move, que pertence à PSA. São 30 carros que estão disponíveis, todos elétricos e distribuídos pelos pontos de recolha fixos.

A outra empresa a operar em Lisboa era a Hertz 24, mas fechou as suas atividades, anunciado no seu site que o fez devido à pandemia. A verdade talvez esteja ligada com a quebra de receitas das empresas de aluguer de automóveis, na sequência da Covid-19, o que levou a Hertz a apresentar-se à insolvência, nos EUA.

Os efeitos da pandemia

Claro que a pandemia teve os seus efeitos, desde logo na falta de turistas, que poderiam ser clientes deste tipo de serviço. Mas os dados mostram que o desinteresse já vinha de trás.

Como se tudo isto não chegasse, acresce uma nova dificuldade à operação do “car sharing” Com a inevitável mudança para frotas de carros elétricos, há uma falta de infraestruturas para carregamento de baterias em tempo útil. E manter uma frota de EV a circular durante uma grande parte do dia.

Conclusão

Como ideia de partilha do automóvel, o car “sharing” não é nada de novo. Há muitos anos, a partilha do automóvel era feita de outra maneira.

Um grupo de colegas que trabalhavam na mesma área e residiam perto uns dos outros, juntavam-se e usavam apenas um dos seus carros para fazerem os trajetos casa-trabalho-casa. Dividiam a gasolina e alternavam a utilização dos carros de todos. E tudo isto sem consultoria de visionários da mobilidade, nem campanhas de marketing associadas.

Francisco Mota

Para percorrer a galeria de imagens, clicar nas setas

Ler também, seguindo o LINK:

Futuro da mobilidade?… Conheça as 7 Mega-tendências