6/10/2023. No terceiro trimestre foi por pouco, mas até ao final do ano a marca chinesa BYD vai ultrapassar a Tesla na produção global de automóveis 100% elétricos. As razões para isso são o tema de mais uma Crónica à 6ª feira no TARGA 67, assinada por Francisco Mota.

 

Até ao ano passado, a BYD dizia que já produzia mais veículos eletrificados que a Tesla, os chamados NEV (New Energy Vehicles) onde se incluem os 100% elétricos BEV (Battery Electric Vehicles) e os PHEV (Plug-in Hybrid Electric Vehicles). Era uma “habilidade” da comunicação da marca chinesa.

Mas os números deste ano já não deixam margem para dúvidas sobre o crescimento da BYD na produção dos BEV, os 100% elétricos, anunciando valores separados para este tipo de veículos.

E os números dizem que, no terceiro trimestre de 2023, a BYD esteve mais próxima do que nunca das vendas da Tesla a nível global. Neste período, a BYD vendeu 431 603 BEV enquanto que a Tesla vendeu 435 059, reduzindo assim a sua vantagem para apenas 3456 unidades.

Tesla fez “obras”

É certo que os resultados da Tesla para este trimestre ficaram cerca de 20 000 unidades abaixo do plano, numa descida de 7% face ao trimestre anterior, devido às obras de recondicionamento das fábricas para a entrada em produção do Model 3 com o novo restyling. Mas a marca continua a garantir que vai chegar aos 1,8 milhões de carros vendidos até ao final de 2023. O problema não é esse.

É claro que a BYD tem no mercado interno chinês a esmagadora percentagem das suas vendas, com apenas 9% de exportações no último trimestre. Mas estão a crescer fora das suas fronteiras, pois no trimestre anterior as exportações valiam apenas 5%.

Falta um compacto

A Tesla também produz e vende na China… e muito! Apesar de a marca não divulgar dados regionais precisos, admite-se que metade da sua produção já tenha origem na fábrica de Shangai.

Mas a Tesla continua a vender apenas modelos dos segmentos D e E, não tendo presença nos segmentos mais acessíveis do mercado dos carros elétricos, nomeadamente o dos familiares compactos.

A sua política de redução de preços tem colocado o mais barato dos Model 3 à venda na Europa pouco acima, ou mesmo abaixo, de modelos europeus elétricos de um ou dois segmentos inferiores, com repercussão positiva nas vendas deste ano.

Na China é diferente

Mas, na China, a realidade é outra. A BYD, que lidera o mercado automóvel geral, tem à venda modelos elétricos mais pequenos e mais baratos, como o Dolphin que chegará em breve a Portugal.

As vendas deste pequeno utilitário elétrico não param de subir na China, com preços de venda a rondar o equivalente a 16 000 euros. Não só os custos de produção são mais baixos do que os do Model 3, como ainda há apoios do Estado chinês à produção de elétricos por marcas locais.

A Comissão Europeia lançou até uma investigação a esta prática, que vai contra as leis da livre concorrência, pelo efeito que pode ter quando os modelos feitos na China desembarcam nos territórios europeus.

Este é o assunto central, que já referi aqui na Crónica à 6ª feira do TARGA 67 por diversas vezes. A negociação entre ambas as partes envolve a eventual criação de novas taxas para os carros elétricos de marcas chinesas, quando entram na Europa, com o Estado chinês a acusar os europeus de protecionismo. Um assunto a acompanhar.

Para onde vai a Tesla?

A Tesla tem reagido no mercado chinês com mais descontos e incentivos aos compradores, diminuindo as suas margens de lucro para tentar manter a quota de mercado. Mas aquilo de que a marca necessita neste momento é de um modelo mais barato que o Model 3.

Há mais de dois anos que se fala de um Model 2, na altura visto como uma necessidade para o mercado europeu. Um familar do segmento C, um rival do VW ID.3 e modelos do mesmo tamanho.

Reuniões entre Elon Musk e Herbert Diess, então CEO da VW, foram amplamente noticiadas, pensando-se que as duas marcas poderiam partilhar a plataforma MEB da VW, como a marca alemã vai fazer com a Ford. Mas o assunto não deu em nada e, entretanto, Diess, foi substituído.

Sozinha ou em JV?

Agora, parece ser o mercado chinês a prioridade para a Tesla entrar nos segmentos B/C o que não parece ser coisa fácil. A não ser que faça uma JV (“joint-venture”) com um construtor chinês que já tenha uma plataforma moderna.

Mas isso não tem sido a política da Tesla, que sempre preferiu fazer as coisas à sua maneira, sem constrangimentos decorrentes de acordos com construtores rivais. Deve ser esse o caminho a seguir.

As últimas especulações apontam para 2025 como o ano do lançamento desse familiar compacto, de nome hipotético Model 2, com um estilo inspirado no da Cybertruck e autonomia entre os 300 e os 400 km.

Conclusão

Que a BYD ultrapasse a Tesla na produção e venda de carros 100% elétricos parece-me uma inevitabilidade. Resta saber que rumo a marca americana vai tomar a seguir, depois de alguns zigue-zagues recentes. Dar prioridade ao lucro por unidade e não ser muito ambiciosa com o volume; ou fazer aquilo que já se ouviu Musk dizer, e partir para a “guerra” do volume, com o objetivo de chegar aos 10 milhões de carros por ano, como faz a líder mundial Toyota. “What’s it gonna be?…”

Francisco Mota

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Crónica – BYD quer “demolir as velhas lendas” do automóvel