24/6/2022 – Quando fala, Elon Musk gera sempre uns bons “soundbites” que fazem as delícias dos jornalistas. Na maioria das vezes são auto-elogios mas, esta semana, aquilo que Musk disse foi bem diferente e merece toda a atenção.

 

“Ambas as fábricas de Berlim e de Austin são gigantescos fornos de dinheiro, neste momento. É realmente como um gigantesco rugido, que é o som do dinheiro a arder.” As palavras são de Elon Musk e foram reveladas esta semana numa entrevista que o CEO deu ao “Tesla Owners Silicon Valley”, um clube de proprietários dos seus modelos, reconhecido pela marca.

O líder da Tesla refere-se aos problemas que a sua marca, e todas as outras, estão a ter com os fornecedores, como consequência da tempestade perfeita criada por três fatores em sequência: os efeitos do Covid-19, da crise dos semi-condutores e da guerra na Ucrânia.

falta de baterias para montar nos Tesla que a marca deseja produzir em grande escala, o Model 3 e o Model Y. Mas também faltam outros materiais, cujos canais de fornecimento foram afetados pela guerra.

China é um problema

As fábricas de Austin, no Texas e em Berlim, na Alemanha não estão a receber da China as baterias necessárias e não conseguem produzir a quantidade de automóveis que o mercado exige.

Mas o caso da fábrica de Shangai, que fechou devido ao Covid-19, talvez seja ainda pior, como disse Musk: “o fecho da fábrica de Shangai afetou a produção local, mas também afetou a fábrica da Califórnia, que recebe vários componentes feitos na China.”

O problema da China é, como se sabe, as restrições de movimentos implementadas devido ao ressurgimento da pandemia, que tem passado por uma fase aguda nas recentes semanas.

Dois anos de crise

Isso tem provocado dificuldades na exportação de produtos dos portos chineses e está a afetar toda a gente. Como disse Musk: “os útimos dois anos foram um pesadelo, com constantes interrupções no fluxo de fornecimento de componentes, uma coisa atrás da outra e ainda não acabou.”

“Como vamos manter as fábricas a trabalhar sem entrar em falência?”

No seu estilo habitual, Musk não evita tirar consequências desta situação quando pergunta: “Como vamos manter as fábricas a trabalhar de modo a pagar aos operários e sem entrar em falência?”

A resposta já a deu há poucos dias, quando anunciou uma redução de 10% nos salários dos seus funcionários durante três meses. Todos têm que participar no esforço…

20 milhões por ano?!

Os planos de expansão da Tesla estão a passar por abrir fábricas onde vende os seus carros, uma prática antiga da indústria automóvel para reduzir o custo final. Por isso as novas fábricas do Texas e da Alemanha são tão importantes, bem como a ampliação da fábrica de Shangai.

Mas os planos de crescimento nas vendas podem não seguir como a Tesla deseja. Musk já afirmou que o seu objetivo é chegar aos 20 milhões de carros por ano em 2030. Uma afirmação que, com os dados de hoje, só pode ser vista como mais uma provocação.

Uma produção anual de 20 milhões de carros seria mais do que fazem hoje os líderes da indústria, a Toyota e a VW, juntos e somando todo o tipo de motorizações destes dois grupos. Impensável, neste momento.

VW aquém do desejado

Herbert Diess, CEO da VW, já disse que o seu objetivo é ser o maior construtor mundial de carros elétricos, justificando assim os enormes investimentos que estão a ser feitos na eletrificação.

Mas o plano não estará a correr extamente como esperado do lado dos alemães. Isto olhando para os valores de produção de carros elétricos no final de 2021. A VW vendeu 477 205 elétrico, enquanto a Tesla atingiu as 913 168 unidades, duplicando a sua produção de 2020.

“Hoje, a Tesla é, de longe, o maior fabricante mundial de automóveis elétricos.”

E segundo os dados já disponíveis para o primeiro trimestre de 2022, a tendência mantém-se com a Tesla a vender 297 819, contra os 108 274 do grupo VW.

Ou seja, hoje a Tesla é, de longe, o maior fabricante mundial de automóveis elétricos, apostando essencialmente em dois modelos: Model 3 e Model Y.

Tudo está em causa

Claro que a Tesla está mais exposta à falta de baterias do que o grupo VW, por uma razão simples: sem baterias, a Tesla não consegue fabricar carros. Enquanto que, do lado da VW, as baterias apenas lhe fazem falta para uma pequena percentagem de todos os veículos que produz.

Esta tripla crise está a pôr em causa o sistema de produção “just-in-time”, que assenta na entrega de componentes nas fábricas pouco antes de serem montados nos automóveis que estão a ser produzidos, evitando assim os grandes stocks de peças.

Os construtores começam a pensar em reformular o conceito, abrindo espaço a maior armazenagem, para ficarem a coberto dos problemas de fornecimento. Mas não só.

Menos globalização

Como já se está a assistir no caso dos semi-condutores, também se equaciona a mudança do paradigma da globalização, em que algumas empresas ou regiões dominam a produção de alguns componentes.

Diversificar a origem da produção de componentes parece ser a ideia atual, pelo menos enquanto a guerra não terminar. Depois, o mais certo é voltar tudo ao mesmo.

Conclusão

Alguns dizem que a instabilidade será “o novo normal” e que a indústria tem que estar preparada para mudar, se quer sobreviver. Talvez isto ainda venha a ser razão suficiente para os políticos adiarem a proibição de produção de carros térmicos a partir de 2035. Seria a maneira de voltarem atrás sem perderem a face e respondendo os anseios de alguns construtores.

Francisco Mota

Para ler, seguindo o LINK:

Comparativo – Tesla Model Y vs. Mustang Mach-E: Qual o melhor?