Kalle Rovanperä dominou o rali de Portugal 2023

O pódio final, com Rovanperä ladeado pelos pilotos da Hyundai

Elfyn Evans da Toyota desistiu por despiste

Dani Sordo ficou em segundo lugar no Hyundai

Mais de 1 milhão de pessoas foram para a beira de estrada este ano

O rali de Portugal continua a ser uma festa

Ott Tanak foi o melhor da Ford, em quarto lugar

Este é o GR Yaris de reconhecimentos

A zona de assistência da Toyota na Exponor

Andava um pouco triste, porque ainda não tinha ganho um rali este ano. Mas em Portugal, Kalle Rovanperä, o miúdo da Toyota dominou a concorrência, repetiu a vitória do ano passado e subiu à liderança provisória do campeonato do mundo. Não admira que este finlandês de 22 anos tenha voltado a sorrir.

 

Acompanho o WRC à distância desde que me lembro, sempre foi a minha disciplina preferida do desporto automóvel. Uma vez por ano eu e mais de um milhão de pessoas vamos para a estrada assistir ao vivo àquilo que vemos na televisão durante o resto do ano: os melhores pilotos do mundo em ação nas estradas de terra das nossas serras.

Como verdadeiros peregrinos, este ano lá estivemos todos outra vez. E outra vez com um comportamento exemplar, que ninguém que passou pelas loucuras dos anos oitenta poderia imaginar possível. A organização voltou a ser elogiada, até pelos pilotos, que geralmente só falam do assunto quando é para criticar.

Mais de 1 milhão de pessoas foram para a beira de estrada este ano

Já foi anunciado que, em 2024, o rali que foi considerado “o melhor do mundo” continuará no calendário do WRC.

Sol, pó e entusiasmo

O tempo estava solarengo e tudo correu na perfeição, nem as nuvens de poeira levantada pela passagem das máquinas híbridas de tração às quatro rodas chegou para sufocar o entusiasmo de ver carros que parecem iguais aos Toyota Yaris, Hyundai i20 e Ford Puma fazer coisas incríveis, nas mãos destes magos do improviso.

Pontos menos positivos também os há, claro. Desde logo uma categoria principal, a chamada Rally1, onde apenas três marcas concorrem, totalizando menos de dez carros de topo. Para quem só se interessa pelos melhores, o espetáculo na estrada acaba depressa.

Kalle Rovanperä dominou o rali de Portugal 2023

Fala-se em mais uma mudança de regulamentos no sentido da simplificação e redução de custos, para atrair mais construtores, um rumor recorrente na história do desporto automóvel, em todas as disciplinas.

Pirelli a furar

As críticas dos pilotos vão todas para os pneus fornecidos em exclusivo pela Pirelli, que se furam com uma frequência alarmante. Um furo, é o fim das aspirações de um bom resultado para os pilotos da frente. Ou têm que parar para mudar a roda e perdem dois minutos, ou continuam em cima da roda furada e arriscam danos graves no carro.

Elfyn Evans da Toyota desistiu por despiste

Mas um furo num WRC, não é como um furo num carro de estrada. Não há pregos nos troços, mas há muitas pedras, regos, buracos e não só, capazes de partir um pneu pelo excesso de maus tratos.

O engenheiro português da Toyota

Dizia-me Rui Soares, o português da Toyota responsável pelo carro de um dos pilotos da equipa, Elfyn Evans (que desitiu por despiste) que “os pilotos se habituaram a ter carros industrutíveis” e que por isso exigem muito dos pneus: “os pneus podiam ser mais resistentes, mas seriam menos rápidos” e depois os pilotos iriam queixar-se disso.

A zona de assistência da Toyota na Exponor

O engenheiro português explicou um pouco sobre o outro trabalho dos pilotos, além da condução a fundo. Todos têm que treinar mecânica, para terem conhecimento e prática para resolver na estrada algum problema que aconteça e que possa ser tratado com as ferramentas que levam a bordo.

Pilotos são mecânicos

Por uma razão simples: os carros só podem ser assistidos pelos mecânicos no parque de assistência, no caso do rali de Portugal instalado na Exponor do Porto, e a horas e duração estipulados. Na estrada, ninguém pode tocar nos carros, a não ser piloto e navegador.

Rui Soares, por vezes dá-lhes trabalho extra, mesmo quando não há nenhum problema: “se vejo que o tempo de assistência está a terminar e ainda falta, por exemplo, sangrar os travões, mando-os fazer isso na estrada, pois é uma tarefa que sabem fazer.”

Mudar a dinâmica

Piloto e co-piloto aproveitam as ligações por estrada pública, sempre feitas a velocidades legais, para parar e fazer alguma tarefa necessária. Já aconteceu terem que montar novos retrovisores.

Mas o mais comum é rodar os seis pneus que podem levar, dois suplentes, durante as rondas de três a quatro troços que fazem entre passagens na assistência.

O rali de Portugal continua a ser uma festa

Mas podem fazer mais. Podem alterar as regulações do carro, seja em termos de ajuste dos amortecedores, seja de altura ao solo o que pode alterar muito a dinâmica.

Num rali de terra como o nosso, é importante fazer isso entre a primeira e segunda passagem pelo mesmo troço, pois as condições do pisos degradam-se muito, com as dezenas de concorrentes inscritos.

Reconhecimentos são o TPC

Mas nada disto é feito de improviso, tudo foi previamente preparado e discutido entre o piloto e o seu engenheiro, incluindo configurações de motor e do sistema híbrido.

Este é o GR Yaris de reconhecimentos

A informação recolhida durante os reconhecimentos também pode ser muito útil. Apesar de ter que ser feita com GR Yaris de série e a velocidades legais.

O trabalho de vídeo

Estes carros estão equipados com câmaras de vídeo e vários sensores que recolhem informação sobre condições meteorológicas e também do estado e características do piso. Os pilotos gastam horas, à noite no hotel, a ver estes vídeos e outros feitos em prova, no ano anterior. As notas do navegador dão fundamentais, mas a memória visual ajuda.

Dani Sordo ficou em segundo lugar no Hyundai

Vistos de fora, em prova, os Rally1 parece seguirem a velocidades impossíveis, em caminhos de terra onde nem todos os SUV à venda no mercado estariam à vontade. Mas a verdade é que os carros de ralis são máquinas muito especiais.

Como se faz um Rally1

Ao contrário dos monoblocos em aço dos carros de série, os Rally1 têm uma estrutura integralmente tubular em aço, uma super-gaiola onde estão ancorados todos os elementos mecânicos, do motor à suspensão. A carroçaria tem efeito apenas estético e aerodinâmico, com uma enorme asa traseira que funciona sobretudo nas curvas a muito alta velocidade.

Ott Tanak foi o melhor da Ford, em quarto lugar

O motor 1.6 turbo é especificamente feito para o WRC, tal como a caixa de velocidades sequencial de cinco e a transmissão às quatro rodas. Em pisos de terra, a altura das suspensões mais parece a de um 4×4 preparado para o Dakar, para resistir aos maus tratos do piso.

O sistema híbrido

O sistema híbrido é fornecido pela organização, é carregado no parque de assistência e depois recarregado durante a condução em estrada pública, seja por regeneração, seja pelo motor de combustão. Em três minutos a acelerar em ponto morto, a bateria fica a 100%.

É uma ajuda em termos de potência, dá mais 134 cv elétricos, o que pode levar a um máximo combinado perto dos 500 cv, por momentos, momentos esses que já surpreenderam alguns pilotos.

O pódio final, com Rovanperä ladeado pelos pilotos da Hyundai

A aceleração 0-100 km/h demora menos de 4,0 segundos. Mas é sobretudo um componente político, para dar a imagem politicamente correta que esta modalidade tem dificuldade em mostrar.

Conclusão

Depois de três dias a andar a fundo nas estradas de terra do centro e norte do país, Kalle Rovanperä, o miúdo da Toyota, voltou a sorrir no pódio final. Ainda falta muito campeonato, mas aposto que está lançado para o seu segundo título, aos 23 anos.

Francisco Mota

Vídeo – Teste Toyota GR Yaris Extreme Rally