24/01/2020 – Na Áustria está a ser feita a experiência de subir a velocidade máxima, em França diminuíram-na, nas estradas secundárias. E em Portugal, seria uma boa ideia subir para os 140 km/h?

 

Os limites de velocidade apareceram nos anos setenta como uma medida de limitar o consumo de combustível, em tempo de crise petrolífera, mas foram ficando.

A situação de quase racionamento de combustível, que se viveu nessa altura, há muito foi ultrapassada, mas os limites de velocidade máxima em autoestrada nunca desapareceram.

A sua permanência foi sendo justificada com outros argumentos, que foram diferindo nos vários países e ao longo das décadas.

O consumo continuou a ser um deles, mas por que poderia perturbar a balança de pagamentos dos Estados, aumentando a dependência da importação de combustíveis.

Segurança manteve o limite

Claro que a segurança não demorou a chegar ao debate, estabelecendo-se como a principal razão que sustenta ainda hoje a permanência dos limites de velocidade.

Contudo, não pode ser ignorado o peso que as multas por excesso de velocidade têm nos orçamentos das autoridades que os controlam.

Por outro lado, a gigantesca evolução das estradas e autoestradas nos últimos cinquenta anos, vai contra esta política de limites de velocidades inalterados.

Do mesmo lado, milita o progresso registado na segurança dos automóveis. Por estas duas razões, o debate sobre a possibilidade de subir os limites de velocidade, é cada vez mais frequente.

Exemplo da Áustria

A Áustria foi dos últimos países a anunciar um aumento da velocidade máxima nas autoestrada, dos 130 para os 140 km/h.

Mas ao anúncio público, bem propagado pelo ministro dos transportes local, o detalhe da operação mostrou que os políticos continuam a ser os mestres do “clickbaite.”

Afinal, o que a Áustria está a fazer é um teste em apenas dois troços da autoestrada de três vias que liga Viena a Salzburgo.

Só se o relatório final deste teste resultar positivo, a medida será alargada a toda a rede de autoestradas do país.

O ministro diz que a medida visa melhorar a segurança, diminuindo os acidentes e “devolvendo às pessoas uns minutos das suas vidas, que gastam em deslocações.”

O clube automóvel da Áustria disse que a medida é ineficaz em termos de segurança, pois a taxa de acidentes da Áustria, com limite máximo de 130 km/h, é igual à da Alemanha, que não tem limites de velocidade máximo em muitos troços das suas “autobahn”.

França desce limite

Pelo contrário, em França, o Estado decidiu em 2018 diminuir a velocidade máxima nas estradas secundárias, de 90 para 80 km/h, numa medida que afetou 400 000 km de vias.

As reações não foram unânimes, mas a medida foi aprovada com base na estimativa que dizia ser possível salvar entre 300 e 400 vidas por ano.

Segundo os dados relativos ao primeiro semestre de 2019, a redução de acidentes diminuiu para mínimos históricos, mas as reações continuam a não ser unânimes.

Segundo uma lei que entrou entretanto em vigor, os autarcas podem pedir a revogação desta descida para os 80 km/h e voltar aos 90 km/h, em alguns troços de estradas secundárias, desde que apresentem um estudo a provar que isso não irá causar mais acidentes.

Limite não é universal

A velocidade máxima nas autoestradas não é a mesma em todos os países europeus, diga-se.

Muitos estão nos 120 km/h, como Portugal, mas outros chegam aos 130 km/h ou mesmo aos 140 km/h, caso da Polónia.

A Alemanha continua a ser o único país em que as autoestradas não têm limite máximo de velocidade, excetos os troços assinalados com limites, que são em cada vez maior extensão.

A indústria automóvel local sempre fez pressão para manter esta falta de limite, vendo-a como um benefício para a imagem dos seus automóveis: se são feitos para andar nos limites, então é porque são seguros, pensam os compradores.

Subir para 140 km/h em Portugal?

E em Portugal, seria benéfico aumentar o limite para os 140 km/h, como está a ser testado na Áustria?

A nosso favor temos a rede de autoestradas que atravessa o país e que, em média, é das mais recentes e das que têm melhor qualidade na Europa, de acordo com classificações de organismos oficiais europeus.

É verdade que os automóveis subiram muito em segurança nas últimas décadas, mas a idade avançada do parque automóvel nacional, que vai nos 12,7 anos em média, é claramente um fator contra.

Mais consumo, mais poluição

Depois vem a questão da poluição. Subindo os limites de velocidade, seria inevitável uma subida nos consumos médios dos automóveis e uma subida de emissões poluentes.

Sabendo a sensibilidade que há para o assunto, nos tempos que correm, a medida ganha contornos de politicamente incorreta.

Falta focar aquele que é sempre o ponto mais importante em caso de acidente, que é o fator humano.

O problema dos “smartphones”

O comportamento dos condutores portugueses tem piorado consideravelmente nos últimos anos, não por terem começado a conduzir mais depressa, mas por darem cada vez menos atenção à condução.

A entrada dos “smartphones” nas nossas vidas invadiu também os períodos em que se está ao volante.

São cada vez mais os acidentes causados porque o condutor estava distraído a olhar para o “smartphone”, em vez de estar olhar para a estrada.

Uma subida da velocidade máxima autorizada, não me parece que pudesse trazer qualquer benefício a este problema, pelo contrário.

Controlo com “margem”

Resta relembrar um hábito que existe em Portugal no controlo de velocidade pelas autoridades.

É uma daquelas leis que não está escrita em lado nenhum, mas todos os condutores têm conhecimento dela: o controlo de velocidade não é rigoroso, sobretudo no que diz respeito aos radares móveis.

Todos sabemos que é dada uma margem acima dos 120 km/h, dentro da qual, ninguém é multado. Uma margem que, não sendo oficial, nem estando publicada, valerá cerca de vinte quilómetros por hora acima do limite oficial.

Muitos condutores guiam já a contar com esta margem, colocando efetivamente o limite nos 140 km/h e não nos 120 km/h. Nada disto é oficial, sublinho, e é sempre possível aparecer um controlo mais rigoroso que aplique multas logo a partir dos 120 km/h reais.

Conclusão

Subir a velocidade máxima em Portugal, julgo que não seria uma medida com bons resultados.

Permanecendo este tipo de leis não escritas, alguns condutores poderiam adotar hábitos de velocidade ainda mais altos.

Os efeitos das distrações ao volante, causadas pelos “smartphones” seriam ainda mais graves, o consumo e emissões poluentes iriam subir.

Para frustação daqueles que dizem serem os limites atuais enfastiantes e que são perigosos porque os fazem adormecer ao volante, a verdade é que um aumento dos 120 para os 140 km/h tem tudo para resultar mal.

Francisco Mota

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