14/06/2019. O presidente da PSA voltou a avisar que os políticos estão a fazer uma perseguição cega à indústria automóvel. A transição “à força” para a eletrificação já está a gerar desemprego.

 

O português que preside à PSA voltou a fazer um “aviso à navegação” sobre os efeitos da “transição energética à força” dos automóveis para a eletrificação.

Referiu dados de desemprego que já são efeito dessas políticas “cegas” e desmascarou a falta de suporte das políticas europeias contra as emissões poluentes de origem automóvel. Também culpou o governo português de ser um dos mais radicais neste assunto.
Foi numa entrevista que deu ao semanário Expresso, conduzida pelo jornalista Abílio Ferreira, que li com muito interesse.

Já não é o primeiro aviso

Não é a primeira vez que Carlos Tavares faz este tipo de discurso, com que, na verdade, todos os dirigentes da indústria automóvel concordam, mas não o podem dizer em público.

As políticas podem não ser as mais acertadas, mas todas as marcas já alinharam na eletrificação, por isso já não querem tomar uma posição pública crítica em relação aos automóveis elétricos, que precisam de promover e vender.

Como justificação para esta atitude, já ouvi isto de uma fonte oficial de uma marca: “fica mais barato fazer os carros elétricos que os políticos querem, do que pagar as multas que eles vão aplicar” referindo-se às multas que todos os modelos que emitirem acima de 95g CO2 /km vão ter que pagar.

Posição confortável

Carlos Tavares colocou a PSA numa posição confortável em que, como ele já afirmou, “não vai ter que pagar nenhuma multa” pois o programa de eletrificação dos seus automóveis está em marcha acelerada: em 2025 todos os modelos da PSA vão ter uma versão desse tipo.

Talvez por isso mesmo, sinta a liberdade de poder dizer aquilo que pensa em relação à eletrificação e às políticas da União Europeia, que considera ameaçarem a indústria automóvel.

Tudo começou em Outubro do ano passado, quando o parlamento europeu decide aprovar a redução de emissões de CO2 dos carros novos em 40%, a partir de 2030.

Tavares afirma que a indústria tinha apontado uma redução de 20% em “condições sociais satisfatórias”, mas os deputados ignoraram essa indicação e resolveram impor o dobro, 40%.

Marcas de automóveis são o Diabo

Segundo Tavares, “o parlamento europeu não ouviu a indústria porque considera que ela é o Diabo” e adianta que a decisão do parlamento não tem sustentação científica: “nenhum deputado teve nas mãos um estudo que fundamentasse a medida.”

O mais curioso de toda a entrevista é que Tavares responsabiliza diretamente o governo português por esta decisão: “Portugal, França e Espanha foram os países que adotaram posições mais extremadas, empurrando o parlamento europeu para o valor dos 40%”.

O líder da PSA considera esta posição estranha pois todos estes países são produtores de automóveis, “apenas a Alemanha adotou uma posição mais reservada e refletida”, declarou.

Despedimentos já começaram

Carlos Tavares relaciona esta decisão com a destruição de 35 000 postos de trabalho na indústria automóvel europeia, anunciada deste então, dizendo que “é uma primeira consequência dessa decisão.”

A visão de Tavares para esta “eletrificação à força” e para as suas consequências é alarmante: “Para já, todos os fabricantes vão comprar baterias à China. A forte procura inflacionará os preços, reduzindo as margens unitárias dos carros vendidos. E isso levará à reestruturação das empresas.” Ou seja, menor produção e mais desemprego.

Democracia em causa

Tavares vai mais longe e põe em causa a democracia no âmbito da União Europeia, quando diz na entrevista do Expresso, que “os nossos representantes tomam decisões, sem ligarem às consequências (…) A verdade é que não houve nenhum estudo sobre o impacte e os efeitos estão à vista. Então aí, temos um problema de funcionamento da democracia.”

O líder da PSA, reforça este raciocínio quando diz que “todos merecem ser ouvidos. A redução de emissões não pode ter um carácter punitivo.”

Fazendo referência aos anúncios de proibição de carros térmicos no futuro, levanta também o problema das assimetrias entre a cidade e o mundo rural, que a eletrificação poderá agravar: “a mobilidade elétrica é mais cara do que a térmica e tem de se encontrar alternativas para a parte da população que não vai ter orçamento para aceder a esse tipo de mobilidade. O mundo rural precisa do automóvel para se deslocar, tem direito à liberdade de movimentos.”

Poluição automóvel é só 15%

Carlos Tavares não tem problemas em dizer o que pensa sobre a eletrificação apressada do automóvel, declarando que “os carros ligeiros representam 15% das emissões de CO2” e a PSA está preparada para oferecer opções elétricas a quem as quiser comprar.

E não deixa de alertar para as dúvidas sobre a pegada de carbono dos carros elétricos, seja na produção de energia elétrica e de baterias, como na sua reciclagem.

Conclusão

Mas talvez esta decisão política, como todas as que são tomadas a longo prazo, possa ter que ser revertida a dado momento no futuro. E por razões de financiamento, como relembra Tavares: “Na Europa, a receita fiscal [sobre os combustíveis] é de 416 mil milhões de euros. Onde vão recair esses impostos? Se for tudo sobre a eletricidade, o preço será um balúrdio!”

Francisco Mota

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