Tesla Model S and Model 3 exhibited at Tesla Store in Washington D.C.

23/08/2019 – Nem todos acham que Elon Musk é um génio ou um pioneiro. O governo de Singapura tem outra opinião, e não é o único a dizer que os elétricos são movidos a… “lifestyle”.

 

O bate-boca entre o líder da Tesla, Elon Musk e o governo de Singapura já vem de Janeiro, quando o americano disse que este Estado asiático estava a ser “lento a adotar os veículos elétricos e que não estava a acolher bem a Tesla.”

O ministro do ambiente de Singapura, numa entrevista citada pelo Automotive News, respondeu agora dizendo que “o que Elon Musk quer produzir é lifestyle” acrescentando que “não estamos interessados nisso, estamos interessados numa solução apropriada que resolva o problema do clima” concluiu Masagos Zullkifli.

Ele é responsável por uma das pastas mais importantes, num Estado de seis milhões de habitantes em que o mesmo partido ganhou todas as eleições desde que a Singapura ganhou a sua independência, em 1959. A Singapura tem o maior números de famílias milionárias, “per capita”.

Fuel Cell são melhores

O plano do governo local não é transformar todos os carros particulares em carros elétricos, o que até seria fácil, pois o governo controla diretamente a emissão de matrículas, por períodos de apenas dez anos cada.

“Seria muito fácil passar todo o parque automóvel para veículos elétricos” disse Zulkifli, “mas essa não é a solução. Já basta termos o problema do estacionamento, agora ainda iríamos ter o problema de determinar quem tem direito a uma tomada para carregar o carro.”

O Ministro do Ambiente admite que não há capacidade para instalar pontos de carga para veículos elétricos em número suficiente, para uma transição energética suave.

Na sua opinião, os Fuel Cell são uma solução melhor a médio prazo, “até pela pegada de carbono que a produção de baterias para carros elétricos produz e pelas dúvidas que há em relação à sua reciclagem” disse o Ministro.

O Grande Plano

O plano do Governo de Singapura para a mobilidade é outro, completamente diferente. Investir massivamente nos transportes púbicos, de modo a que o transporte individual deixe de ser necessário.

Num território de apenas 720 quilómetros quadrados, o objetivo é que, até 2040, qualquer viagem dentro da ilha não demore mais do que 45 minutos.

A esta mensagem, fica subjacente uma futura limitação na atribuição de matrículas para carros privados, o que certamente não será do gosto de todos, e algo que seria muito difícil de implementar noutros países.

O meu outro carro é um…

As declarações de Zulkifli podem parecer agressivas em relação a Musk, mas será que existe uma parte de verdade naquilo que ele diz?

Observando as motivações de compra de muitos clientes do Model 3, percebe-se que as emissões zero locais, são a última coisa que os fascina. O que realmente lhes importa é serem vistos dentro do carro mais “fashion” do momento.

Este fenómeno não é novo. Se pensarmos na maneira como a Tesla se lançou no mercado, com um Roadster elétrico, feito com base no chassis do Lotus Elise, vendido a um preço desmedido, isso fica bem claro.

Quem comprava o Roadster não o fazia por ser o melhor desportivo de dois lugares do mercado, mas por transmitir uma imagem de consciência ecológica em relação ao seu condutor.

O mesmo aconteceu quando o Model S foi lançado, com um preço de um automóvel de luxo. Só os compradores mais endinheirados podiam aceder a este ícone da mobilidade elétrica.

E muitos deles levavam o Model S para a sua garagem, para fazer companhia aos seus outros carros: grandes SUV a gasolina ou gasóleo e superdesportivos de elevadas performance. Bem podiam colar no vidro traseiro do Tesla aquele antigo autocolante: “o meu outro carro é um…”

Como os iPhone

Mas o que Zulkifli diz da Tesla, também outros dizem de outros veículos elétricos, posicionados no pólo oposto do mercado.

Kohei Hitomi, o japonês que lidera o projeto do novo Honda E – que deverei testar no final do ano – afirmou à revista inglesa Autocar que “se a preocupação de um comprador é o preço, então um carro elétrico não é a escolha certa.”

O engenheiro nipónico acrescentou ainda que “é como nos smartphones. Quem tem um orçamento reduzido, não vai comprar um iPhone X. Mas se está mesmo interessado na tecnologia e nas funcionalidades, então o preço torna-se uma questão secundária.”

Elétricos porque são “cool”

Hitomi até parece estar em sintonia com Zulkifli, quando afirma esperar que “os compradores optem pelo Honda E por ser “cool”, pelo estilo, pelas funcionalidades e por uma maneira completamente nova de combinar a mobilidade e o lifestyle.”

O discurso do responsável da Honda faz mais sentido quando descobrimos que o novo citadino elétrico “E” tem uma bateria de apenas 33,3 kWh, que não lhe dá mais de 200 km de autonomia, abaixo do BMW i3 e do Renault Zoe.

Isto, apesar de se esperar para o “E” um posicionamento de preço acima desses rivais, contra os quais perde ainda no espaço para passageiros e na capacidade da mala. Mas ganha na apresentação nostálgica.

Conclusão

Estamos longe de perceber exatamente o que os carros elétricos vão representar na sociedade, a médio prazo. Mas parece que os elevados custos de produção estão a empurrar alguns construtores a posicionar os seus carros elétricos como produtos “lifestyle”, como disse o Ministro do Ambiente de Singapura.

Isso não vai necessariamente desagradar aos fabricantes que embarcaram na aventura dos carros elétricos. Há um mercado em crescimento para produtos “lifestyle” vendidos a preços altos. Talvez não consigam resolver o problema da poluição, nem fazer a propalada “transferência energética” mas vão conseguir ganhar dinheiro com a venda de carros elétricos, o que já é um passo em frente face ao que muitos temiam.
Francisco Mota

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