Primeiro chega o convite, com vários meses de antecedência, acompanhado de um esboço do programa: ouvir o que os técnicos do projeto têm para dizer e tentar fazer as perguntas certas, para dizerem um pouco mais. Depois guiar o carro em estrada, mas com a carroçaria e os interiores camuflados.

A película mágica

Não é a primeira vez que, no âmbito da minha qualidade de jurado do Car Of The Year (peço desculpa pela formalidade…) sou convocado para uma sessão deste género. Com a invenção das películas pretas e brancas que fazem um “nó” nos olhos e baralham as câmaras fotográficas, este tipo de evento tem ganho popularidade entre as marcas: convidar alguns jornalistas para guiar, em primeira mão, uma unidade “pré-série”, sem realmente poder ver como é o estilo. Admito que me sinto frustrado por vir de lá sem ter visto o carro, mas a possibilidade de o guiar em estrada, totalmente à minha vontade e até com uma passagem programada por uma pista de terra com obstáculos TT, mais do que compensou.

Sim, eu prometo…

Há formalidades a cumprir, como assinar uma carta de compromisso a garantir que não vou publicar nada sobre o carro antes de uma determinada data – na verdade é uma questão de dar a todos os jornalistas a mesma oportunidade, pois o evento costuma durar vários dias. Antigamente, os enviados especiais dos cinco maiores mercados, tinham sempre prioridade.

Fui autorizado a levantar a manta que cobria todo o tablier, mas foi uma espreitadela “for your eyes only” sem direito a fotos

Fotografar é possível, mas só por fora. Por dentro, fui autorizado a levantar a enorme manta que cobria todo o tablier e consola, exceto o painel de instrumentos. Mas foi uma espreitadela “for your eyes only” sem direito a fotos. Há duas razões para isto. A primeira é por uma questão de gestão de expetativas no público, para lhes criar a curiosidade que será satisfeita mais tarde. Por outro lado, sendo pré-séries, por vezes a qualidade dos materiais ainda não é a final, e a marca não quer dar uma ideia errada do produto final.

Pré-série feitos à mão

Estas primeiras unidades são muitas vezes montadas com muito maior percentagem de mão-de-obra humana do que as que vão sair da linha de produção automatizada, mas isso não quer dizer que sejam melhores ou piores. O que quer dizer é que o seu custo foi muito superior, subindo a valores de que os responsáveis das marcas raramente querem falar, para não escandalizar ninguém. Números com seis algarismos, pelo menos.

Ouvir os outros

Estes testes com a imprensa também servem para ouvir a opinião de pessoas que guiam dezenas ou centenas de carros por ano e que têm uma sensibilidade muito particular para avaliar e fazer comparações com a concorrência de forma muito imediata. Algumas marcas chegam a dizer que ouvem esses comentários e que depois os incorporam na versão final. Na maioria das vezes, isso é apenas uma cortesia para nos fazer pensar que somos importantes. Mas há casos de pequenas afinações, tipicamente de suspensão, transmissão e calibragem de motor que são de facto feitas após estes testes.

Conclusão

No final, quase sempre saio destes eventos com a promessa de voltar para ver o produto final, já sem a irritante película e com os responsáveis da marca dispostos a falar com maior detalhe sobre o produto. Neste caso, o ensaio tinha como protagonista o Seat Tarraco, o SUV de sete lugares que se vem posicionar como o topo da marca espanhola. Mas o procedimento é quase sempre o mesmo, com todas as marcas. Detalhes dos bastidores da indústria automóvel, uma das mais complexas.