Como sempre, o salão de Tóquio é quase exclusivo das marcas locais, que se divertem a mostrar alguns concept-cars realmente “loucos”. Mas também há coisas muito sérias para ver.

Talvez porque as expetativas são muito mais baixas do que as que tenho quando viajo para os salões de Frankfurt ou para Paris, o salão de Tóquio de 2019 acabou por cumprir aquilo a que se propôs: mostrar as novidades das marcas locais.

São poucas as marcas estrangeiras que se deslocam a este evento, porque não vale a pena. O mercado está tão blindado à entrada de marcas não japonesas, e a cultura dos compradores é tão avessa a comprar carros estrangeiros que é muito raro ver um carro de uma marca não local a circular nas estradas.

Este ano, as únicas marcas de fora que se fizeram convidadas foram a Renault e Alpine (pela mão dos parceiros da Aliança Nissan), a Alpina, cujos caríssimos BMW transformados não precisam de vender muito para fazer negócio e a Daimler, que tem realmente uma boa implantação no território.

As estrelas foram, como sempre, as marcas japonesas, com a maior de todas à cabeça.

O “show” de Akyo

A Toyota está a fazer uma viragem no sentido de se tornar numa fornecedora de mobilidade, mesmo que essa manobra seja tão lenta como um petroleiro a fazer inversão de marcha.

Akyo Toyoda, o presidente, herdeiro do fundador, não poupou energias em palco para montar um espetáculo de um homem só, na tentativa de mostrar o seu entusiasmo pela mudança.

Para quem, como eu, o viu correr nas 24 horas de Nürburgring com o Lexus LFA, não deixa de soar um pouco estranho que o homem a quem corria gasolina nas veias agora apareça com uma atitude de alta voltagem.

Mas é a vida. Todos temos que nos adaptar e ele tem que dar o exemplo, para ver se o petroleiro se despacha, pois a ideia dominante é que a Toyota está atrasada na eletrificação: “na tecnologia, não estamos, só ainda não temos um carro elétrico no mercado” é a versão oficial.

No próximo ano o “problema” vai começar a ser resolvido com o primeiro carro elétrico da empresa a chegar ao mercado, que vai ser um Lexus.

Na próxima Crónica à 6ª feira, prometo que vou falar mais deste momento da Toyota.

Salão não desilude

Quanto ao salão de Tóquio, este ano inaugurou um novo pavilhão, distante da nave principal, o que obrigou os jornalistas principiantes a perder tempo nas filas para o autocarro que fazia a ligação.

Os meus anos de experiência levaram-me a apanhar o metro de superfície, muito mais rápido e com muito menos gente. São os benefícios da idade…

De resto, crise foi coisa de que não se ouviu falar, apesar de eu não perceber uma palavra de japonês.

Mas bastava olhar para a cara feliz dos expositores, a cara atarefada dos funcionários do evento e a cara estafada dos jornalistas. Lá como cá, no dia de Imprensa há sempre mais VIP do que jornalistas. Mas vamos aos carros!

Toyota dominou

A Toyota já tinha mostrado as suas principais novidades num evento a que assisti na véspera e de que já escrevi ontem e que pode ler seguindo este link:

Salão de Tóquio: Toyota mostra Mirai e outras “coisas”

O Mirai é a grande estrela, seguido pelo concept-car LQ, pelo módulo de transporte e-Palette e pelos veículos elétricos ultra compactos, onde brilha um excelente citadino de dois lugares, para os júniores e séniores que não tenham carta.

Mas o discurso inflamado de Akyo, não chegava para animar os jornalistas, por isso ficou guardada uma surpresa na forma do e-Racer.

Um minúsculo desportivo de dois lugares em fila, que mais parece um kart com carroçaria e rodas gigantes.

Chega-me pelo joelho e é um daqueles “brinquedos” que dá vontade de saltar para dentro e acelerar de imediato.

Claro que é elétrico, claro que o condutor vai quase deitado. Mas não tem asas à vista, nem um para-brisas.

Na verdade, era apresentado como um simulador, em que os visitantes do salão se podiam sentar, depois de escolher uma “bacquet”, colocar uns óculos digitais e “guiar” numa pista virtual. Só isso.

Lexus e a eletrificação

A maior novidade do grupo foi o Lexus LF-30 Electrified, um elétrico de quatro lugares com portas de abertura em asa de gaivota.

Garanto que, ao vivo, é ainda mais estranho que em fotos, com as enormes entradas de ar dianteiras, os flancos amachucados e a traseira demasiado alta. A marca diz que será o estilo Lexus no ano 2030, eu espero que não…

Mas tem tração às quatro rodas, por ter um motor elétrico por roda. Mais importante, estreia uma nova plataforma elétrica que servirá modelos elétricos da marca na primeira metade da próxima década e um novo sistema elétrico.

A Lexus admite que, só com os híbridos não consegue cumprir as normas de CO2, por isso já confirmou uma versão elétrica, com base num modelo atual, para lançar já em 2020 e que será mostrado em Novembro.

Depois terá também híbridos “plug-in” e “fuel cell”. Até 2025, todos os modelos vão ter versões eletrificadas.

Mazda pregou uma rasteira

Surpresa foi o Mazda MX-30, o primeiro veículo elétrico da marca. Quando toda a gente esperava que fosse apenas um CX-30 adaptado para elétrico, como as imagens “teaser” deixavam adivinhar, eis que a Mazda mostra uma variante diferente.

Com portas traseiras de abertura invertida e tejadilho com formato coupé na traseira.

A plataforma é a do CX-30 e 3, devidamente reforçada para levar uma bateria de apenas 35 kWh, capaz de 200 km de autonomia.

Parece pouco, mas a Mazda acha que é suficiente para um segundo carro da família. Arriscado, tendo em conta a concorrência.

Sem surpresa, o elétrico recebe o nome e-Skyactiv, tem 143 cv e já está em pré-encomenda, para entrega no final do próximo ano.

Jazz só em híbrido

Muito esperada, a quarta geração do Jazz acabou por ser uma desilusão, em termos de estilo, que parece bem mais conservador que o modelo atual e claramente menos radical que o Civic.

Talvez seja uma questão de público-alvo, pois mantém a posição de condução alta, facilidade de acesso e muito espaço interior.

Foi mostrada já uma versão com suspensão mais alta e proteções nos guarda-lamas chamada Crosstar.

Como já era sabido, o Jazz (Fit no Japão) passa a estar disponível apenas em versão híbrida, mas é um híbrido a sério, não é um “mild-hybrid”.

Vai usar o mesmo princípio do CR-V Hybrid, com dois motores elétricos e um motor a gasolina, tudo coordenado por uma transmissão de variação contínua.

Mas não terá o motor 2.0 do CR-V, a Honda ainda não revelou se será um 1.0 ou um 1.5 litros. Vai estar à venda em 2020, sendo o primeiro rival direto do Toyota Yaris Hybrid. E vai encaixar-se na sub-marca e:Technology, que englobará todos os eletrificados da marca.

Nissan Ariya é para fazer

Ainda é um “concept-car” mas já está muito bem acabado. O Nissan Ariya não é um exercício de estilo, mas aponta para uma nova linguagem de desenho.

A Nissan nunca desperdiça dinheiro em “concept-cars” que não vão dar a lugar nenhum. Por isso é de esperar que o Ariya antecipe um novo SUV a chegar ao mercado até 2021.

Para já, tem dois motores elétricos, um por eixo, e tração às quatro rodas, com a bateria sob o piso, estreando uma nova plataforma elétrica na marca (e na Aliança) do tipo modular.

Pode assumir várias dimensões (o Ariya tem 4,6 m) e levar vários tamanhos de baterias.

Willys com turbina?…

Do lado do terceiro elemento da Aliança, a Mitsubishi, também foi mostrado um “concept-car” que prefigura um SUV eletrificado. Mas o formato escolhido para o Mi-Tech foi o de um bizarro SUV descapotável sem portas, a lembrar os Willys da segunda guerra.

O motor a gasolina dá lugar a uma turbina de gás, que pode ser alimentada a gasóleo, álcool ou querosene. Esta turbina atua um gerador de corrente que alimenta quatro motores elétricos, um por roda, através de uma bateria com função “plug-in”.

Todo o sistema é ainda bastante experimental e não se espera que chegue à produção em breve. Mas a plataforma é nova e uma boa indicação da direção que a marca vai tomar.

Estas foram as grande novidades do Salão de Tóquio. Mas havia mais, dedicadas ao mercado local dos carros citadinos, os chamados K-cars, ou “concept-cars” neles inspirados. Desses, pode ver um resumo na galeria de imagens.

Conclusão

A edição deste ano do salão de Tóquio acabou por não desiludir, pelo menos não tanto quanto o recente salão de Frankfurt. Mas os organizadores sabem que têm que rever a fórmula e já estão a pensar na maneira de dar mais ao público visitante.

A ideia é que os visitantes possam testar os carros expostos, em pistas desenhadas no perímetro do evento. Talvez seja a fórmula para evitar que os salões desapareçam, se bem que o entusiasmo dos japoneses pelos automóveis e por eventos deste tipo seja ainda mais forte que na Europa.

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Salões do automóvel: princípio do fim?…