Não é todos os dias que um sindicato propõe à administração que sejam os trabalhadores a “pagar” 25% do custo de uma nova fábrica. Mas foi isso que aconteceu na Porsche.

 

A iniciativa veio do sindicato dos trabalhadores da Porsche, em Zuffenhausen e a administração foi toda ouvidos: que tal se 25% do custo da nova fábrica do elétrico Taycan fosse financiada pelos trabalhadores?…

Esta terá sido uma daquelas propostas que uma administração não pode recusar, tanto mais que trazia vantagens para todos os envolvidos, quando estudada ao detalhe.

Os 32 000 trabalhadores entregavam mensalmente à administração 0,25% dos seus aumentos previstos entre 2017 e 2025. Em contrapartida, a partir de 2021 e até 2030, os trabalhadores começam a receber o que emprestaram, acrescido de um juro de 0,03%.

Uma fonte da marca estimou que essa restituição ronde os 760 euros por ano, em média.

Quadros “pagam” 0,5%

Face a esta iniciativa, é claro que a administração não podia deixar de envolver também os 2000 quadros superiores, que contribuíram com 0,5% dos seus aumentos no mesmo período de tempo, com a diferença de que não os vão receber de volta, ao contrário dos trabalhadores.

No total, estima-se que esta contribuição represente 25% dos 800 milhões que custou a nova fábrica do Taycan, erigida em Zuffenhausen. É o sinal da vontade que o sindicato tinha de que a nova fábrica fosse feita aqui e não noutro lugar, assegurando os postos de trabalho.

Taycan no coração da Porsche

Oliver Blume, CEO da Porsche justifica a construção da fábrica do Taycan no centro de Zuffenhausen (aproveitando um local que foi liberto depois de demolidos pavilhões antigos) para que o novo modelo elétrico nascesse no coração da marca. No mesmo sítio onde foram criados o original 356 e o lendário 911.

É claro que há nisto uma parte de verdade e outra de romantismo. O diretório do Grupo VW, proprietário da Porsche, avaliou outros locais onde a construção da fábrica pudesse ser mais barata, como por exemplo em Leipzig, onde a marca também produz.

Mas os homens da Porsche tinham outro argumento: é em Zuffenhausen que existem os trabalhadores com o maior “know-how” da empresa, trabalhadores melhor preparados para receber uma formação específica que lhes permita ajudar a fazer esta revolução tecnológica, que significa a construção de um Porsche elétrico.

Os “Green Bonds”

É óbvio que a contribuição dos trabalhadores pesou na decisão final, mas não só. Em paralelo, a Porsche emitiu os chamados “Green Bonds”, obrigações com incentivos fiscais que só podem ser usadas para atividades sustentáveis.

A operação começou com mil milhões de euros, mas os investidores foram tantos que subiu aos 2,75 mil milhões.

Muitos dos investidores vieram da China, mas também de outras partes do mundo, para aquela que foi a maior emissão de “Green Bonds” alguma vez feita por um construtor de automóveis.

Não admira, este produto financeiro é dos mais rentáveis do momento, por isso não é de esperar que tenha tido tanta procura.

Mas para que esta emissão dos “Green Bonds” fosse possível, a Porsche teve que dar garantias, a primeira das quais foi que a fabricação do Taycan e do Taycan Cross Turismo fossem neutras em termos de emissões de dióxido de carbono, entre outros critérios.

Dos referidos 2,75 mil milhões de euros, 45% foram usados na pesquisa e desenvolvimento do projeto Taycan e os restante 55% foram aplicados na construção da fábrica.

Políticos ajudaram

As autoridades locais e federais também deram o seu apoio ao projeto Taycan, até porque foram abertos 1500 novos postos de trabalho, após um período de construção que demorou quatro anos e envolveu 2050 operários.

Mas o Taycan é só a face visível do plano de investimento que a Porsche tem para a mobilidade elétrica e que ascende a 6 mil milhões de euros, aplicados até 2022.

Na inauguração da fábrica, a que tive oportunidade de assistir, Oliver Blume disse que “a Porsche pode fazer tudo. Mas o produto precisa de ser melhor do que tudo o que é comparável”, citando uma frase de Ferry Porsche.

Wolfgang fala do pai

Wolfgang Porsche, o neto de Ferdinand Porsche e filho de Ferry Porsche, afirmou a seguir que “fazemos o Taycan aqui, porque foi aqui que tudo começou. Foi aqui que o meu pai começou. Há mais de 70 anos que daqui saem alguns dos carros desportivos referenciais. O Taycan é também uma experiência que junta o passado e o futuro.”

Na mesma cerimónia, o presidente da câmara de Estugarda disse que o Taycan, palavra que significa a alma de um cavalo jovem, “se adapta perfeitamente ao escudo da cidade, que também tem um cavalo.”

E acrescentou ainda que “cabe aos políticos fornecer as infra-estruturas necessárias à transferência energética: as energias renováveis e os postos de carga.”

Conclusão

Mas sem dúvida que a afirmação mais incisiva veio da boca do ministro-presidente do Estado de Bade-Württenberg quando devolveu as recentes piadas de Elon Musk acerca do Taycan: “a Elon Musk digo o seguinte: queremos usar ideias verdes para escrever números a preto, não a vermelho.”

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