27/09/2019 A Maserati anunciou um plano de investimento em fábricas, lançamento de novos modelos e a inevitável eletrificação. Será desta que a histórica marca italiana se vai “safar”?

 

A história da Maserati está cheia de períodos conturbados, ao nível da gestão e administração. Mas, pelo meio, sempre foi conseguindo fazer alguns dos mais extraordinários carros de estrada e de competição.

Tudo começou em 1926, quando os irmãos Carlo, Bindo, Alfieri, Ettore e Ernesto decidiram fundar em Bolonha a Officine Alfieri Maserati. O objetivo era construir carros de competição, para vender a clientes ricos e para correrem eles próprios.

O sexto irmão chamava-se Mário e era o único que não ligava a carros, preferia as Artes, mas foi ele que desenhou o tridente que ainda hoje é o símbolo da marca.

Inspirou-se na estátua de Neptuno, que está na fonte da Piazza Maggiore, em Bolonha. Um símbolo de força e vigor e um dos emblemas da cidade.

Tragédia à italiana

Alfieri era o mais habilidoso ao volante, mas acabou por perceber que era melhor tratar do negócio do que andar a “brincar” às corridas.

Mas a tragédia bateu-lhe à porta, morrendo na mesa de operações, após um acidente numa corrida.

Ettore ficou com a responsabilidade da Officine e teve bastante sucesso, conseguindo fazer carros de Grande Prémio capazes de bater os Buggati nos anos trinta.

De Bolonha para Modena

Mas não durou muito, pois em 1938, os irmãos decidem vender a Maserati ao industrial Alfredo Orsi, de Modena.

O acordo mantinha os irmãos à frente da empresa durante mais dez anos, passando depois a bola ao filho de Orsi, Omer, que ficou a liderar.

Por esta altura, já a Maserati se tinha mudado de Bolonha para Modena, uma heresia, não fosse a Segunda Grande Guerra ter relativizado a vida de toda a gente.

Antes de saírem da companhia, os irmãos ainda fizeram o primeiro Maserati de estrada, o A6 1500 com carroçaria Pinin Farina, apresentado no salão de Genebra.

Um carro com linhas simples e elegantes, mas que não foi um sucesso, com o seu motor de 65 cv.

Campeões do Mundo

Omer queria mais carros de estrada, mas Ernesto não estava para aí virado e quando os irmãos saíram da empresa, fundaram a OSCA, para se voltarem a dedicar aos carros de competição.

Mas Orsi nunca tinha desistido por completo da competição e, em 1952, inscreveu a Maserati no Campeonato do Mundo de Fórmula 1.

Incrivelmente, conseguiu vencer o título de pilotos em 1957, com o mestre Juan Manuel Fangio ao volante do fabuloso 250F.

Mas logo a seguir, os seus outros negócios entraram em crise financeira e teve que se retirar da competição, centrando-se novamente nos carros de estrada, com o 3500 GT, um coupé de luxo que usava uma versão civilizada do motor de F1.

Até 1964, este carro, vendido com carroçarias feitas por vários carroçadores, vendeu 2223 unidades, ultrapassando a Ferrari, em alguns anos.

O fabuloso 5000 GT

Mas os clientes pediam e Orsi voltou a fazer um GT de competição, o 450S com motor V8, uma das máquinas mais espantosas da sua geração e cujo motor serviu de base ao próximo coupé de estrada, o 5000 GT com 330 cv.

Repetia-se a fórmula do GT de grande luxo, mas num patamar ainda mais elevado, atraindo os milionários de todo o mundo, que consumiram 34 unidades.

A partir daqui, a Maserati começava a ter bases de trabalho suficientes para criar modelos diferentes usando os mesmo motores e chassis.

O Sebring, destinado ao mercado dos EUA foi um deles e o Mistral, a pensar na Europa, ficou na história da marca.

Em 1965 foi lançado o México, uma berlina/coupé de duas portas que partilhava o chassis e motor com a primeira geração do Quattroporte.

Foi também daqui que nasceu o coupé Ghibli, outro ícone da marca, desenhado por Giugiaro. O conceito fastback 2+2 seria levado ao extremo com o Indy de 1966, o último carro a usar uma variante do motor original de seis cilindros em linha, feito pelos irmãos Maserati.

A era Citroën

Em 1968, a Citroën iniciou uma colaboração com a Maserati, que envolveu a venda aos franceses de uma quota maioritária na casa italiana. Nasciam os primeiros Maserati de motor central, o Merak V6 e o Bora V8, com o primeiro a partilhar o motor com o Citroën SM.

Mas o regresso aos motores dianteiros aconteceu logo em 1974, com o Khamsin, que usava alguns dos sistemas hidráulicos da Citroën.

Os franceses chegaram mesmo a fazer uma segunda geração do Quattroporte com a mecânica do SM e tração à frente. Mas os clientes não gostaram da “brincadeira”…

Foi nesse ano que a Peugeot comprou a Citroën e deu ordens para que a Maserati fosse vendida… ou fechada. A casa italiana estava tecnicamente falida, após a crise petrolífera.

Salva por De Tomaso

Alejandro De Tomaso arriscou e comprou a Maserati, com ajuda do Estado italiano. A sua primeira medida foi mudar a grelha e o motor do seu De Tomaso Longchamps e lançar um novo Maserati, o Kyalami.

Em 1981, a Maserati deu mais um salto, com o lançamento do Biturbo, um carro feito com base num monobloco em aço e suspensão traseira independente.

O alvo eram as melhores berlinas desportivas da BMW e Mercedes-Benz. Mas o estilo era demasiado anónimo e nem os vários “restylings” e versões especiais conseguiram fazer do Biturbo um sucesso.

Salva pela Fiat

A Maserati estava novamente com problemas e desta vez seria a Fiat a comprar 49% da companhia a De Tomaso, em 1992. No ano seguinte completou a operação e comprou os restantes 51%, começando uma nova revolução.

Foi construída uma nova fábrica, em Modena e a Fiat vendeu 50% da Maserati à Ferrari, em 1997, o resto no ano seguinte.

Os dois rivais de sempre habitavam agora sob o mesmo telhado, os dois inimigos de incontáveis corridas, “dormiam” agora na mesma cama.

Pior ainda, a Maserati sofria a ignomínia de ser propriedade da inimiga Ferrari. Claro que a Fiat ainda era proprietária da Ferrari.

Crescimento, enfim!

Mas tudo isto era romance, o que interessava era o que estava para vir e o que estava para vir era o maior período de crescimento da Maserati.

O primeiro resultado visível desta nova realidade foi o lançamento do 3200 GT, em 1998, primeiro ainda com o V8 Maserati, mas a partir de 2002 com o V8 Ferrari.

Talvez o cúmulo da associação entre as duas marcas tenha sido o Maserati MC12, na verdade um Enzo Ferrari modificado. Um carro que trouxe alegrias na competição, à Maserati.

Em 2005, a Fiat decide separar a Maserati da Ferrari, criando um novo grupo entre a Alfa Romeo, Maserati e Abarth, do qual a Abarth saiu pouco depois, por razões óbvias.

Além de gestão e finanças, não havia nenhuma significativa partilha de componentes entre a Maserati e a Alfa Romeo.

Mais um erro…

Recentemente, o CEO da FCA, Michael Manley, afirmou mesmo que esta associação foi um erro, não trazendo nada de bom para nenhuma das marcas. A Maserati passou a ser tratada como uma marca de grande produção, coisa que nunca foi.

Há 11 anos, a gama Maserati recebeu o duo Gran Turismo e Gran Cabrio, que ainda hoje estão no catálogo. Há cinco anos, foi a vez do atual Quattroporte e do Ghibli e há dois anos do SUV Levante.

Não são precisas muitas contas para perceber o envelhecimento da gama. As esperanças estavam viradas para o Levante, mas o entusiasmo com que foi recebido no mercado da China, rapidamente começou a esfriar.

Queda a pique

No ano passado, a queda de vendas da Maserati rondou uns assustadores 20%, descendo das 46 300 unidades em 2017 (o seu melhor ano de sempre) para as 36 500 unidades. Logo se percebeu que alguma coisa tinha que ser feita e com urgência.

Harald Wester, que tinha sido CEO da Maserati entre 2008 e 2016, com resultados positivos, tinha regressado à FCA para cargos julgados mais importantes.

Mas o seu improvável substituto, o americano Reid Bigland, que era o chefe de vendas da FCA nos EUA, acabou num litígio em tribunal contra a FCA.

Finalmente, um plano

Wester voltou e não perdeu tempo a substituir alguns dos homens que estavam em lugares chave e, esta semana anunciou o seu plano de ação.

Em 2020 o Ghibli vai ser renovado e vai receber uma versão híbrida “plug-in”, depois virá finalmente o superdesportivo Alfieri, visto pela primeira vez como “concept-car” em 2014.

Vai ser o primeiro carro elétrico da marca, mas também terá versões a gasolina e “plug-in”.

Em 2021, será a vez de ser lançado um novo SUV, mais pequeno que o Levante, portanto um rival do Porsche Macan.

Depois será a vez do Gran Turismo e Gran Cabrio serem finalmente substituídos, também com versões elétricas, gasolina e “plug-in” e em 2023 chegará a altura de substituir o Quattroporte e Levante.

Conclusão

O plano passa, como é óbvio, pelo recondicionamento das fábricas italianas onde os Maserati vão continuar a ser feitos e esse é o ponto que a FCA não quer deixar de frisar: todos os Maserati vão continuar a ser 100% Made in Italy.
O investimento total da FCA em Itália é de 5 mil milhões de euros, para todas as marcas, incluindo uma fatia pequena para o Tridente, Será desta que a Maserati vai finalmente conhecer a estabilidade que merece e que nunca teve?

Francisco Mota

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