26/04/2019. A China já tem a sua Tesla e o seu Elon Musk e não se trata de cópias de baixa qualidade. A Nio de William Li está no mercado chinês e prepara a sua entrada nos EUA e na Europa.

 

Os chineses têm a fama de copiar tudo, geralmente mantendo o aspeto exterior, mas diminuindo em muito a qualidade. Mas a máxima de que “a cópia é a forma máxima de elogio” começa a não pegar, desde logo nos tribunais chineses, onde a Land Rover acaba de vencer o seu processo de vários anos contra as cópias do seu Range Rover Evoque.

Mas isso não quer dizer que os melhores exemplos não possam surgir de inspiração para alguns empreendedores chineses, como é o caso de William Li.

Nasceu numa quinta

Nascido em 1974 em Anhui e criado numa quinta, deve ter impressionado tanto os seus pais, quando era criança, que a família decidiu poupar dinheiro para o mandar para a universidade de Pequim, onde tirou um bacharelado em Sociologia e um grau inferior em Direito.

A instrução deve ter surtido efeito, pois Li já investiu em mais de 40 empresas e a sua fortuna pessoal foi este ano avaliada pela Forbes em 1,4 mil milhões de dólares.

A sua aventura na indústria automóvel começou com a Bitauto, de que foi CEO entre 2000 e 2013, tendo vendido a companhia nessa altura, para fundar a Nio.

Tudo começou em 2014

A nova marca começou a trabalhar em 2014 e, dois anos depois, já tinha pronto o seu primeiro carro, um superdesportivo de dois lugares e 1360 cv (1MW) designado EP9 e feito em conjunto com os especialistas da Rimac. Lembra-se como começou a Tesla?…

Este hipercarro conseguiu estabelecer o recorde da volta mais rápida ao Circuito das Américas, em condução autónoma, uma verdadeira proeza.
Mas o EP9 é apenas um mostruário daquilo que a Nio quer fazer. Tal como a sua participação na Fórmula E, onde está desde o início desta modalidade.

SUV elétricos de luxo

Os seus produtos principais são muito mais adaptados ao mercado atual: dois SUV elétricos, luxuosos e de altas performances. Primeiro a ser lançado foi o ES8, em Julho passado, com uma potência combinada de 650 cv, habitáculo para sete e autonomia para 355 km.

O segundo SUV vai chegar este ano, é mais pequeno (4,850 m) e alinha-se com modelos como o Audi e-tron, Mercedes-Benz EQC ou o futuro Tesla Model Y. Vale a pena observar alguns detalhes do ES6 para perceber para onde a Nio quer ir.

Engenharia de qualidade

A plataforma é a mesma do ES8, feita em alumínio e fibra de carbono, anunciando a maior rigidez torcional do segmento, com 44 930 Nm/grau. A carroçaria é em alumínio com alguns componentes em plástico.

O habitáculo de cinco lugares, pelo menos a julgar pelas imagens, tem um acabamento que junta a tecnologia e o luxo, ficando a meio caminho entre a extrema simplicidade da Tesla e a maior opulência dos modelos alemães.

Quanto à parte que realmente interessa, a mecânica elétrica, o ES6 está disponível com duas baterias, uma de 70 kWh e uma nova de 84 kWh. Com a bateria de maior capacidade, anuncia uma autonomia de 510 km, mas ainda segundo a antiga norma NEDC.

Duas versões

Estão disponíveis duas versões de potência, ambas com tração às quatro rodas. A Standard tem dois motores elétricos, um por eixo, com 160 kWh cada, totalizando 435 cv e anunciando uma aceleração 0-100 km/h em 5,6 segundos.

Depois há uma versão Performance, com um motor de 240kW na frente e outro de 160 kW, atrás, totalizando 544 cv e anunciando os 0-100 km/h em 4,7 segundos. Se detetou alguma coincidência com a Tesla…

Mais original é a oferta de carregamentos. Claro que a Nio também tem a sua rede própria de carregadores rápidos, facilmente localizáveis através do sistema de infotainment, que recebe atualizações “over the air”.

Troca bateria em 3 minutos

Mas a Nio também instalou postos robotizados para troca de baterias, uma ideia que não é nova, mas que foi rejeitada por várias marcas, por ser demasiado complexa. A Nio, pelos vistos, não pensa da mesma forma.

Estas infra-estruturas ocupam três lugares de estacionamento e tudo o que o condutor tem que fazer é estacionar o seu Nio no local apropriado. Depois é ver os robots desaparafusarem dez parafusos, para libertar a bateria de 500 kg, que é trocada por outra carregada.

O processo demora três minutos, segundo a Nio, e no posto há sempre quatro baterias que estão a ser carregadas. Já há uma autoestrada chinesa equipada com estes postos e o plano da Nio é instalar 1100 outros postos no país.

Carregamentos VIP

Mas se nenhuma destas soluções for do agrado do cliente, ainda tem mais duas opções, uma de “desempanagem” constituída por uma frota de furgões, cada um equipado com um carregador capaz de dar 100 km de autonomia em dez minutos.

Para clientes que não se querem mesmo maçar com nada disto, podem simplesmente chamar um serviço VIP da Nio, que vai buscar o carro onde o cliente estiver, carrega-o, faz qualquer outra operação de atualização, manutenção ou limpeza que seja necessária, e devolve-o com a autonomia máxima.

Planos para a Europa e EUA

Para já, a Nio só está a vender carros na China, mas tem planos para entrar na Europa e EUA, criando comunidades de utilizadores. Segundo Li, a Nio estima vender 20 000 carros em 2019, antes de começar a subir para valores mais significativos.

O “Musk chinês” resolveu os problemas da construção dos seus automóveis da maneira mais prática possível, alocando a produção à empresa estatal chinesa JAC, que tem anos de experiência na indústria automóvel e produz centenas de milhar de carros por ano.

A Nio tem centros de design, desenvolvimento e planeamento em Shangai, Londres, Munique, e Califórnia, não se trata de uma empresa fechada no mercado chinês. No ano passado, Li lançou a Nio na bolsa de Nova Yorque.

Mas a sua política de comunicação tem sido, até agora, praticamente limitada ao mercado doméstico. Pelo que se pode perceber da parte técnica e logística, a Nio está no bom caminho, seguindo alguns dos passos da Tesla e inovando noutros aspetos. Isso deveria ser a parte mais difícil, mas não é.

Conclusão

Hoje em dia, o mais difícil é ter a melhor comunicação possível, para obter a melhor imagem junto da população, quer se trate de potenciais compradores ou simples entusiastas. E a Tesla fez isso melhor do que qualquer outra marca de automóveis.

A Nio está muito longe de ter essa relevância. Neste momento está em conversações com associações de utilizadores de carros elétricos, na Noruega para perceber qual será a melhor maneira de abordar os mercados externos, mas desconfio que não vai ter vida fácil. Contudo, será curioso ver o embate entre a Tesla e a Nio, no mercado chinês.

Francisco Mota