No preciso momento em que estava a refletir sobre o enorme trabalho da Honda no desenvolvimento da segunda geração do seu Clarity Fuel Cell, eis que surgiu o comunicado da Daimler a dizer que vai cancelar os seus programas relativos a esta tecnologia. Ou seja, enquanto a Honda e a Toyota continuam a investir na pesquisa e no desenvolvimento de modelos movidos a Fuel Cell (pilha de combustível é a tradução oficial para português) a Mercedes-Benz vai deixar de pensar no assunto. O confronto de atitudes entre o Ocidente e o Oriente, seria a maneira mais fácil de pegar neste assunto, mas talvez não a mais abrangente.

Até foram dos primeiros…

A Mercedes-Benz foi das primeiras marcas a apresentar protótipos de automóveis Fuel Cell modernos, a desenvolver a tecnologia e a estabelecer datas para a comercialização de modelos deste tipo, que foram sendo adiadas. Agora que tem um GLC Fuel Cell https://www.mercedes-benz.com/en/mercedes-benz/vehicles/passenger-cars/glc/the-new-glc-f-cell/  pronto a entrar no mercado, decide parar com tudo, apesar de esta nova versão ter algum futuro, sabendo-se que será vendido para frotas que funcionem perto dos postos de abastecimento de Hidrogénio que, entretanto, foram sendo instalados em algumas cidades alemães, com os respetivos incentivos do governo. As razões para esta tomada de posição da Daimler são explicadas no comunicado da marca: segundo o CEO da companhia, Dieter Zetsche, o aumento da autonomia e a descida dos tempos de recarga das baterias dos carros elétricos estão a melhorar o suficiente para tornar pouco interessante a solução da pilha de combustível.

Japoneses têm outras ideias

Do lado da Honda, a visão não é essa. Para os japoneses, o que interessa é o tempo presente e a experiência que já têm com a primeira geração do Clarity, lançada em 2009. Com um tempo de reabastecimento dos depósitos de Hidrogénio a demorar menos de cinco minutos e a autonomia a aproximar-se dos 600 km, a Honda acredita que os veículos exclusivamente elétricos ainda vão demorar algum tempo a chegar a valores comparáveis com estes. A Toyota, com o seu modelo a pilha de combustível, Mirai, pensa o mesmo que a Honda e também desenvolveu o seu modelo a um nível muito elevado.

É claro que os modelos a pilha de combustível são muito mais complexos do que os elétricos com a sua bateria

A decisão da Daimler, tem que ser vista à luz de uma racionalização dos investimentos em novas tecnologias: não há vontade de gastar dinheiro em tudo e mais alguma coisa, é preciso tomar decisões e seguir os caminhos que julgam ser os mais rentáveis. É claro que os modelos movidos a pilha de combustível são muito mais complexos do que os elétricos, apenas com uma bateria. Na verdade, os elétricos são os automóveis mais simples que se conhecem, desde que se conhecem automóveis. Pelo contrário, uma pilha de combustível pode ser vista como uma minicentral de produção de energia elétrica, que utiliza a reação química entre o Hidrogénio e o Oxigénio para produzir energia elétrica, que depois segue para uma bateria, que vai alimentar o motor elétrico, o qual faz efetivamente mover o veículo. Não é simples, mas os japoneses não têm parado de a desenvolver, sem ficarem reféns desta tecnologia, deve dizer-se.

Amigos por interesse

Do lado da Honda, a nova plataforma do Clarity foi pensada para ser usada também em versões elétricas e “plug-in”, enquanto do lado da Toyota, o programa Prius, continua a assegurar a liderança da marca no mercado dos híbridos, com ou sem “plug-in.”
Talvez a explicação para esta diferença de estratégia resida menos na técnica e mais nas alianças que se foram estabelecendo para o desenvolvimento das pilhas de combustível. A Toyota assinou um acordo de colaboração com a BMW, especificamente para a área das tecnologias relacionadas com o Hidrogénio, conhecendo-se o historial que a marca de Munique tem neste assunto. A Honda estabeleceu, já este ano, um acordo com a GM para a instalação de uma fábrica de pilhas de combustível em Detroit. Recorde-se que a GM foi a primeira marca a apresentar um automóvel movido a pilha de combustível, em 1966, com tecnologia que tinha sido desenvolvida para o programa espacial da NASA. Depois, em 2007, levou a cabo um extenso programa piloto com uma frota de 100 modelos Chevrolet Equinox Fuel Cell, que percorreu cinco milhões de quilómetros nas mãos de utilizadores normais, em condições reais.

Conclusão

São acordos como estes, entre vários fabricantes, que permitem potenciar o desenvolvimento e diminuir os custos de investigação e de produção. Talvez por não ter feito nenhuma aliança nesta área, a Daimler tenha chegado à conclusão que, pelo menos por enquanto, o melhor que tem a fazer é focar o seu investimento nos automóveis elétricos.