Viver na sombra do “todo-poderoso” Golf é um problema. Sobretudo para um modelo equivalente, no grupo VW. Mas talvez o Skoda Scala tenha encontrado a solução…

 

O Golf é o Golf!… Um fenómeno de vendas a nível europeu e global, uma referência contra a qual todos os familiares compactos do mercado se têm que medir.

São décadas e gerações de Golf que se sucedem umas às outras desde os anos setenta, sem nunca perder o estatuto que já fez dele um ícone. Contrariar isto, não é fácil.

Menos fácil ainda quando o “concorrente” vem de dentro, uma espécie de “fogo amigo”: um modelo equivalente de outra marca do grupo VW.

O lado “negro” das sinergias

As sinergias – partilha de componentes entre vários modelos – têm muitos méritos, sobretudo na redução de custos de produção. Mas também colocam alguns entraves, como a dificuldade de diferenciação entre modelos. E não estou a falar do estilo.

Como colocar no mercado, a preços diferentes, dois modelos que partilham quase tudo aquilo que realmente interessa e apenas se distinguem pelo estilo da carroçaria e dos interiores?

O marketing costuma dar a resposta a esta questão, posicionando cada modelo de forma a que, a custos de produção iguais, possam corresponder preços de venda diferentes.

Ter marcas premium ajuda muito, pois o mercado aceita pagar mais por esses modelos. Mas o que fazer quando as margens se esmagam, devido à necessidade de ser competitivo contra o resto do mercado?

A resposta só pode ser uma: reduzir ainda mais os custos de produção, procurando outro tipo de sinergias. Foi isso que a Skoda fez com o Scala.

Scala igual a Golf?

Aos olhos do mercado e da fita mética, o Scala é um concorrente do Golf, mas não partilha a mesma plataforma.

Enquanto o VW usa a MQB “normal”, o Skoda usa a MQB A0, ou seja, a plataforma do Polo, explorada até aos seus limites dimensionais.

Assim se ganha a margem suficiente para conseguir um rival interno do Golf, com custos de produção mais baixos (as marcas nunca quantificam este assunto…) o que permite chegar às tabelas de preços com números uns milhares de euros inferiores.

No caso da Skoda, que tem passado por um processo de subida continua de qualidade e de conteúdo, esta estratégia permitiu ainda salvar uma parte da margem, precisamente para dotar o Scala dos atributos que lhe permitem manter a subida na qualidade apercebida.

Estilo Skoda

Sem ser um modelo propriamente inovador em termos de estilo, o Scala tem o mérito de alinhar perfeitamente na linguagem da marca, feita de arestas bem marcadas.

E ainda acrescenta dois detalhes de “classe”, que são o vidro traseiro a prolongar-se até mais baixo e o símbolo traseiro substituído pela marca escrita por extenso.

Abrindo a porta do condutor, o que se nota de imediato é a qualidade dos materiais usados para as zonas altas do tablier e das portas da frente, todos de toque macio e aspeto sofisticado. E não são os únicos.

Mesmo os plásticos mais duros, usados nas zonas mais baixas e menos frequentadas pelos dedos dos ocupantes, têm um aspeto de alta qualidade, sem brilhos e com juntas de montagem muito apertadas. Dizer que um Golf é melhor, nesta área, será forçar a nota.

Qualidade e bom ambiente

Claro que há soluções astuciosas, como a adoção de bancos dianteiros com encostos de cabeça integrados: são mais simples e baratos de fazer e até dão um ar desportivo ao habitáculo.

Mas não se pode acusar a Skoda por isso, afinal a Mercedes-Benz faz o mesmo no Classe A…

O tablier tem um desenho relativamente conservador, mas inclui um monitor central tátil muito bom e um painel de instrumentos digital configurável, nesta versão Style.

Passando para os lugares da segunda fila, espaço para os joelhos não falta, o que não é de estranhar, pois a distância entre-eixos de 2649 mm é 13 mm maior que a do Golf.

Tivesse um pouco mais de largura e o Scala seria dos poucos compactos capazes de levar três adultos com conforto no banco de trás. A mala chega aos 467 litros, o que é muito bom.

Ao volante: tudo no sítio

A posição de condução é muito boa, com um banco relativamente confortável e com apoio suficiente. O volante está muito bem posicionado, mas escusava de ter a base plana, que não serve para nada e incomoda, na condução. As regulações são amplas.

Comandos secundários bem localizados, simples de identificar e alguns bons espaços de arrumação.

Com a caixa DSG de dupla embraiagem e sete relações, pedem-se patilhas no volante, que o Scala tem, mas de tamanho tão pequeno que quase se têm que pressionar com as unhas.

Uma das coisas que a MQB-A0 perde em relação à MQB é a possibilidade de ter suspensão traseira independente, mas as versões do Golf, a este nível de potência, também têm um eixo de torção, como o Scala.

O habitual “pisar” VW

Mas isso em nada afeta o conforto. O Scala tem aquele “pisar” hiper-controlado dos produtos VW, capaz de passar sobre o mau piso sem incomodar os ocupantes.

O condutor sabe sempre em que condições está a estrada, mas nunca é incomodado se estiver muito estragada. Só mesmo em pisos muito degradados, as jantes de 19” com pneus de baixo perfil geram vibração em excesso.

Já o motor 1.0 TSI, o conhecido três cilindros com turbocompressor, aqui na configuração de 116 cv é um exemplo de suavidade e disponibilidade a todos os regimes. Com 200 Nm de binário máximo às 2000 rpm reage imediatamente aos pedidos do condutor.

DSG é um exemplo

Claro que a caixa DSG de dupla embraiagem de sete relações tem aqui um papel importante, mais ainda quando se usam as patilhas. A aceleração 0-100 km/h está anunciada em 9,9 segundos.

Quanto aos modos de condução disponíveis Eco/Normal/Sport/Individual, não dão acesso a grandes mudanças no mapeamento do acelerador ou assistência da direção.

Usando o modo Eco, consegui uma média de consumos de 6,7 litros, com um misto de tipos de condução. É um bom valor, que deve algo ao modo “bolina” que a caixa DSG faz com frequência.

A prontidão do 1.0 TSI incentiva a levar o Scala para estradas com traçados mais exigentes, para o testar numa condução mais dinâmica. E a primeira conclusão vem exatamente do motor.

Excelente o 1.0 TSI

O 1.0 TSI não se importa de ser levado até às 6500 rpm, única altura em que o trabalhar típico do três cilindros pode incomodar. Mas é claro que dá o seu melhor nos regimes baixos e intermédios.

A caixa é muito rápida e suave, a subir de relação e obediente, nas reduções feitas com as patilhas. Aproveita muito bem o motor e dá várias hipóteses de condução.

Também a direção está muito bem calibrada, com o peso e a desmultiplicação certas. É precisa o suficiente, sem nunca ser nervosa. O mesmo digo da facilidade de modular a travagem.

Atirado para dentro de uma curva média com algum exagero, o Scala consegue manter uma atitude neutra até velocidades relativamente altas, altura em que a frente começa a subvirar.

Nessa altura, o ESP entra ao trabalho e faz a sua função com eficiência, sem exageros: ajuda em vez de recriminar o condutor.

Não é desportivo, mas…

Guiado com alguma delicadeza e depois de perceber exatamente o ponto em que o ESP entra, é possível curvar depressa sem interferência da eletrónica, tanto mais que os pneus têm uma aderência muito alta.

Mas assim que se provoca um pouco a traseira, o controlo de estabilidade volta à cena, desta vez com algum estrondo.

Conclusão

Não foi objetivo da Skoda fazer do Scala um desportivo, mas as sensações que transmite numa condução rápida são sempre muito confiáveis.

Numa condução normal, o Scala agrada pela atitude muito suave e fácil, pelo amplo espaço do habitáculo e pela qualidade de construção. Na verdade, tudo isto poderia ser dito acerca de um Golf com o mesmo motor.

Francisco Mota

Potência: 116 cv

Preço: 23 715 euros

Veredicto: 4 (0 a 5)

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