Como vamos estar em casa durante algum tempo, decidi pôr em dia os meus testes, em carteira. A partir de hoje, pode ler todos os dias um teste novo no Targa 67. O primeiro é o Clio TCe 130 RS Line.

 

A obrigação de estar em casa gera a tendência de “arrumar” alguma coisa. No meu caso, decidi pôr em dia os testes que tenho vindo a acumular e começo pelo modelo mais vendido em Portugal, o Renault Clio, numa versão que me agrada particularmente.

Há muitos anos, antes dos turbos terem tomado de assalto tudo o que é motor, as diferenças entre as várias versões de uma gama eram feitas pela cilindrada.

Isso acabou e agora, de duas uma, ou a designação de cada versão é puramente comercial/histórica e não tem nenhuma relação com a mecânica; ou então faz referência à potência, que acaba por ser o mais relevante.

É o que se passa com a Renault e com este Clio TCe 130, ou seja, uma motorização a gasolina com 130 cv de potência. Um quatro cilindros com um turbo, claro, e uma caixa EDC7, ou seja, dupla embraiagem com patilhas no volante.

Não é o mais vendido, esse papel está reservado ao TCe 100 com o novo motor de três cilindros, que custa 19 910€, também na versão RS Line. O TCe 130 RS Line é a versão acima e custa mais 4 000€. Vale a pena, por mais 20 cv?

Não é só o motor que muda

A pergunta está mal feita, pois à diferença de preço entre os dois tem que se subtrair o valor da caixa EDC7, que o 130 tem e o 100 não tem. Além de outras diferenças de equipamento.

O RS Line não é um RS desportivo, mas tem uma série de acabamentos e detalhes de decoração que lhe dão um ar bem mais apelativo que a versão intermédia Intens, por um acréscimo de pouco mais de 2000 €.

Se não tiver que contar os tostões, é uma versão que vale bem aquilo que custa a mais. Até porque o novo Clio não mudou muito o estilo, sobretudo nas versões menos equipadas.

Quando se abre a porta e se ocupa o lugar do condutor, é fácil perceber qual foi a prioridade da Renault nesta geração do Clio. A qualidade dos materiais do anterior Clio era o seu ponto fraco, agora é o seu ponto forte.

Outro ambiente

Não só os materiais usados são melhores, como o desenho, o ambiente e o equipamento subiram muito. O monitor central tátil, na vertical, é o protagonista, mas o condutor atento e entusiasta percebe outras coisas antes disso.

A ergonomia da posição de condução é muito boa. O que quero dizer é que o volante tem a inclinação certa e está muito bem posicionado, face ao banco.

A visibilidade para diante é boa e os comandos secundários são fáceis de alcançar, estando grande parte agrupados em teclas sob o monitor central.

Claro que há detalhes a melhorar. O banco é confortável e tem bom apoio lateral, mas o assento podia ser um pouco mais comprido e mais alto, sob as pernas.

O volante tem um diâmetro exagerado, mas permite ler bem o painel de instrumentos digital. Ganharia com mais um pouco de amplitude na regulação do alcance.

As patilhas da caixa EDC7 fixas ao volante são muito pequenas, porque abaixo delas estão os antiquados satélites que a Renault usa há décadas.

Nem tudo está no monitor

Voltando ao monitor central, a sua utilização é lógica, com poucas teclas físicas de atalho e os comandos da climatização estão bem separados por baixo e são rotativos, o que é sempre a melhor opção.

Uma das teclas dá acesso ao Multi Sense que é o comando dos modos de condução, no vocabulário da Renault.

E, neste caso, as diferenças na resposta ao acelerador, assistência da direção e passagens de caixa são claramente diferentes, entre o modo Eco e o Sport.

As diferenças para o TCe 100 começam a perceber-se assim que se coloca o TCe 130 em marcha. Desde logo pelo som mais suave do motor de quatro cilindros e pela sua excelente resposta, sobretudo a regimes baixos e médios.

A caixa de dupla embraiagem acompanha bem o motor, com passagens quase sempre suaves.

Nas manobras, há situações em que a caixa gera alguns solavancos. Mas nada de muito grave. Não está disponível uma caixa manual, nesta versão, mas desconfio que, uma boa unidade, poderia fazer melhor serviço.

A surpresa da suspensão

Mais inesperada é a diferença na suspensão. Mantendo a mesma geometria MacPherson, à frente e eixo de torção, atrás, a verdade é que o “pisar” do TCe 130 é bem mais sofisticado que o do TCe 100.

Começa por se mostrar mais confortável, com melhor filtragem do ruído de rolamento, com a sensação de melhor aderência e melhor amortecimento. Em cidade, o TCe 130 parece de um segmento acima, face ao TCe 100.

O virtuosismo dinâmico do Clio já vem de longe e a anterior geração estava já no topo do segmento. Não foi a mudança para uma nova plataforma que veio mudar isso.

Não é preciso aumentar muito o ritmo para perceber que o Clio continua a transmitir aquela sensação de ter mais “chassis que motor”, ou seja, que a suspensão é capaz de lidar facilmente com mais potência do que os 130 cv disponíveis nesta versão. E isso dá imensa confiança.

Dinâmica de primeiro nível

O Clio sente-se largo e estável, com pouca inclinação lateral, mesmo em curvas mais rápidas. Em estradas com curvas mais lentas, o Clio volta a mostrar competência e acrescenta gozo á condução.

A direção tem excelente precisão e nenhum nervosismo, que costuma ser o “truque” de algumas marcas para dar a sensação de comportamento desportivo.

O nível de confiança é tanto que rapidamente o condutor é “convidado” a explorar os limites de aderência.

É preciso exagerar muito para surgir alguma subviragem, quando se entra em curva depressa de mais. O ESP é relativamente suave a corrigir a situação, se o condutor insistir em não levantar o pé do acelerador.

ESP é dos que ajudam

Aliás, a calibração deste ESP é outros dos pontos altos da dinâmica do Clio. Em geral, não aprecio um carro em que o ESP não se possa desligar por completo.

Mas alguns engenheiros conseguem chegar a compromissos aceitáveis, como neste caso.

Só mesmo nas violentíssimas mudanças de direção esquerda-direita, o ESP se mostra mais autoritário. Nas outras situações é uma ajuda, mesmo para quem gosta de guiar depressa.

Jogando bem com as massas é possível aproveitar a margem que o ESP oferece e colocar a traseira do Clio a rodar ligeiramente, na entrada em curva. Com prática e espaço disponível, chega mesmo a ser possível colocar o Clio a escorregar às quatro rodas, sem “acordar” o ESP.

Mesmo em situações de entrada em curva, há alturas em que o ESP consegue evitar a subviragem ao mesmo tempo que promove uma ligeira rotação do carro para descrever a curva com o máximo de segurança e algum entretenimento.

Voltando à condução do dia-a-dia, o Clio TCe 130 usado ao ritmo da cidade e com alguns percursos de via rápida pelo meio, registou um consumo combinado de 7,6 litros, o que é mais do que aceitável.

Conclusão

Claro que a maioria esmagadora das vendas de modelos como o Clio são feitas a frotas de todo o tipo, que dão prioridade ao esmagamento das margens e optam pelas versões menos potentes.

O Clio também está disponível com um motor 1.0 sem turbo de 75 cv, o SCe que custa 15 700€.

Mas, para o comprador particular, que vai pagar mensalmente o seu Clio, tem no TCe 130 uma versão bem melhor que o TCe 100, com um conjunto de vantagens que vão muito além dos 30 cv de potência a mais.

Francisco Mota

Potência: 130 cv

Preço: 23 920 euros

Veredicto: 4,5 (0 a 5)

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