Parece um Focus igual aos outros, mas não é. O ST 2.3 Ecoboost é, provavelmente, o melhor desportivo do seu segmento no mundo real. Saiba porquê neste teste pré-Covid-19.

 

Fechado em casa, decidi pôr em dia os meus testes a novos modelos no Targa 67.

Desta vez, proponho uma sessão de condução “a fundo” numa das minhas estradas de serra preferidas, num Domingo de manhã… em época pré-Covid-19.

Maxilas pintadas de vermelho por trás de umas jantes 19” de desenho aberto, montadas numa suspensão que parece um pouco mais baixa e é: 10 mm.

um spoiler comprido na tampa da mala e uns logos ST. E um cinzento metalizado escuro que ia jurar ser igual ao de muitos outros Focus.

Abro a porta, o tablier é o mesmo do Focus ST-Line, mais uns logotipos ST e uns bancos Recaro que, esses sim, prometem alguma coisa de diferente.

Demasiado discreto?

Nas primeiras impressões, o Focus ST é discreto ao ponto de desiludir. Mas isso faz parte do conceito: só gastar dinheiro onde é preciso. A Ford Performance não se tem dado mal com esta filosofia, como se viu no Fiesta ST.

Sentado ao volante, não demoro a perceber a escolha destes bancos desportivos, com bom apoio lateral, mas não demasiado duros.

O ângulo da coluna de direção é o correcto, por isso o volante “cai” nas mãos naturalmente. Se não tivesse aquela base plana, que de nada serve, seria perfeito.

A alavanca da caixa está a um palmo de distância, a mão direita vai à procura do punho e nunca falha.

O som certo

Botão “start engine” pressionado e o quatro cilindros turbo 2.3 acorda com um “cantar” cheio de “Bass” e pouco “Treble”.

Dou duas aceleradelas e ouço o sintetizador a fazer o seu perfeito “playback” através dos altifalantes: parece mesmo que o som vem todo do motor.

Meto primeira na caixa manual de seis, num movimento sem resistência, mas rigoroso e decidido. Largo a embraiagem, um pouco “pesada” e atiro-me para o circuito… urbano.

Mesmo em modo Normal, a suspensão é firme, sem ser seca. A família não se queixa mas, nos pavimentos ondulados, as suas cabeças vão continuamente a acenar um “sim” involuntário.

O raio de viragem é o único contra, numa utilização diária. E os consumos, para quem achar que gastar 13,0 l/100 km é muito, guiando sem preocupações de economia e misturando vários tipos de estradas… e de condução. A Ford anuncia 7,9 l/100 km de média.

De resto, o Focus ST é como os outros Focus: muito bem construído, com boa habitabilidade, apesar do tejadilho baixo e mala mais que aceitável. Mas isso já sabia.

Direto à montanha

Poupo a gasolina para a queimar numa das minhas estradas de montanha preferidas. Num Domingo de manhã, estrada deserta, sem rasto de nuvens, 16º no termómetro: perfeito!

Os modos de condução disponíveis são Normal/Desporto/Pista de corridas/Escorregadio, na tradução que a Ford escolheu. Como em muitas outras coisas, prefiro o original em inglês: Normal/Sport/Track/Wet.

O botão para os escolher está no volante, mas também há uma tecla “S” para ir diretamente ao modo Sport, como o “Sport Response” do Porsche 911, só que não acaba ao fim de 20 segundos. Continua.

Começo a minha sessão. Arranco a fundo, os 280 cv agarram-se todos ao asfalto e impulsionam o ST para a frente. Em 5,7 segundos estou a 100 km/h, diz a Ford e nem usei o “launch control”.

Caixa manual, claro!

As passagens de caixa são um gozo! A função “flat-shifting” deixa trocar de mudança sem levantar o pé do acelerador.

O curso da alavanca é 7% mais curto que nos outros Focus e nem faltam as “shift-lights” no painel de instrumentos. Não são muito espetaculares, para não gastar dinheiro, lá está.

Por isso, não se espere páginas e páginas de “telemetria” no monitor central. O que há a mais no ST está no display atrás do volante e não é muito. Mas não me faz falta, para ser honesto.

Chego rápido à primeira curva, já em quarta e tenho que travar forte, bem forte. Os travões, com discos de 320 mm e maxilas de dois êmbolos, à frente, são quatro vezes melhores que no Focus ST anterior, diz a Ford.

Não me queixo da sua potência, nem do ataque inicial que dá imensa confiança, nem da facilidade de dosear o esforço.

Eletrónica que ajuda

Desço até segunda, com a caixa a fazer um “ponta-tacão” tão bom que rapidamente desisto de tentar fazer melhor.

Atiro o ST para dentro da curva e a frente imediatamente se agarra à trajetória, sem a largar. A direção é 15% mais direta que nos outros Focus e isso nota-se na rapidez e nos acertos que vou fazendo. Mas o melhor vem a seguir.

Mesmo sem provocações, a suspensão traseira multibraço faz o Focus rodar em torno do eixo da curva.

Não é a traseira a deslizar, é a suspensão a “enrolar” a curva, com a ajuda da vectorização de binário. Parece que alguém me está a “dar uma mão”, mas vou sozinho no carro.

Acelero a meio da curva e esgoto logo a segunda, mas sem esgotar a tração. O ST tem um “truque” que se chama eLDS, um autoblocante ativo com embraiagem de comando eletrónico.

No limite, consegue passar 100% da potência para uma das duas rodas motrizes dianteiras. Sim, o ST é um tração à frente, deixando espaço para o RS, que deverá ser 4×4 híbrido.

A caixa mostrou-se curta o suficiente para entrar na segunda curva em terceira. Peço um pouco mais aos travões e aos pneus, mas os Michelin Pilot Sport 4S resistem sem problema.

Extrema confiança

A confiança na “máquina” cresce de imediato. O ST é daqueles carros que parece terem sido feitos por medida para mim. Para mim e para todos!

Ganha-se confiança num par de curvas. À terceira, já entro depressa demais, tenho que aliviar o acelerador, já a curvar e a traseira desliza num arco perfeito.

Nem muito nem pouco, os graus que preciso para me manter na minha faixa e voltar rápido ao acelerador.

O ESC não ameaça estragar a “festa”, sobretudo depois de o colocar no seu modo Sport, idem para o diferencial.

Acelero cedo e forte, a direção pede-me mais força nos punhos, porque o diferencial está a fazer o seu trabalho…

“Tem” que sair de frente…

Mas um FWD “tem” que sair de frente, por isso exagero para lá dos limites e encontro o que procuro: uma ligeira subviragem.

Alivio um pouco e sou retribuído com um fabuloso deslizar às quatro rodas, muito pouco comum em carros de tração à frente.

Tudo muito controlado, muito previsível, mas mesmo no limite. Volto atrás e faço o mesmo, mas desta vez não alivio, só para ver aquilo de que o eLDS é capaz.

Continuo a acelerar e a subviragem acaba por ser convertida numa atitude neutra. Regressa a rotação induzida pela eletrónica.

É a função “preditiva” do eLDS a funcionar, que usa os sensores do carro para se preparar para o cenário mais provável que vai enfrentar.

Modo Track melhor que Sport?

Passo ao modo Track e a direção, que nunca é leve, fica mais pesada, a suspensão mais firme e o barulho mais alto, sublinhado por detonações nas desacelerações. Desligo o ESC.

A condução fica mais emotiva, porque a suspensão passa a trabalhar menos, quando o piso não é perfeito.

Exige mais atenção e mais tensão nos braços. Em estrada, não se ganha muito e desta vez até concordo com o aviso que aparece de cada vez que se liga este modo: “Para uso só em pista”.

Também o ESC está tão “longe” no seu modo Sport que, em estrada, mesmo a andar depressa, poucas vezes chega a entrar, por isso, desligá-lo não é um ato de heroísmo.

Até porque o acerto muito ágil e divertido em curvas lentas e médias, se transforma numa atitude estável e previsível, nas curvas mais rápidas.

O motor do Mustang

Com a atenção centrada no “chassis”, o motor acaba por passar para segundo plano, o que não quer dizer que desiluda, pelo contrário.

Com 420 Nm a partir das 3000 rpm, e pouco menos abaixo disso, tem sempre resposta desde os regimes mais baixos. Usa um “anti-lag” semelhante ao desenvolvido para o Ford GT.

E depois gosta de brincar com o “red-line”, onde chega ainda com vontade de dar mais.

Andar pelas 6500 rpm não é um problema para este bloco que passou da instalação longitudinal no Mustang, para a transversal, no ST, com novos coletores de admissão e escape e novos apoios.

Conclusão

Mais uma vez a Ford fez muito, com pouco. O resultado é superior à soma das partes. Claro que o ponto de partida já era muito bom, prova disso é que a plataforma C2, só disponível com cinco portas ou SW, não precisou de reforços para aumentar a rigidez no ST.

Na verdade, nem a suspensão precisou de muitas modificações, as molas são apenas um pouco mais firmes que as de um ST-Line (mais 20%, na frente e mais 13%, atrás).

A Ford Performance fez aqui mais um excelente trabalho. Eu diria melhor que os concorrentes, quando se soma tudo. O Focus ST é daqueles carros que não apetece largar.

Francisco Mota

Potência: 280 cv

Preço: 41 728 euros

Veredicto: 5 (0 a 5)

 

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