10/6/2022 – A Seat, como marca de automóveis, tem os dias contados. O grupo VW está a apostar tudo na Cupra e nada na Seat. Os próximos três anos vão ser os últimos para a Seat, pelo menos tal como a conhecemos. Saiba quais as razões para esta decisão não anunciada.

 

O Grupo VW (ainda) não anunciou o fim da Seat, mas todos os indícios apontam para que os dias da marca espanhola estão contados. Todas as declarações que os responsáveis máximos do Grupo VW e da prória Seat têm feito vão no sentido de acabar com a Seat, no seu formato atual.

O primeiro indício é mais que óbvio: enquanto todas as marcas se desdobram em anúncios de novos modelos para os próximos anos, essencialmente elétricos e eletrificados, da Seat há meses que nada é divulgado sobre a sua gama de produtos.

A razão só pode ser uma, nada está previsto. Não há planos de substituição dos modelos atuais, nem entrada nos elétricos. Note-se que o Cupra Born chegou a ser dado como o primeiro elétrico da Seat e isso nunca aconteceu.

Fim do ciclo em 2025

Da atual gama de modelos, quase todos estão a chegar ao final do ciclo de vida de sete anos, até 2025. O Ateca foi lançado em 2016 e completa os sete anos em 2023, o Ibiza e Arona são de 2017 (fazem sete anos em 2024), o Tarraco é de 2018 (sete anos em 2025) e apenas o Leon é mais recente, de 2020.

O plano, não anunciado, deve ser o de deixar chegar estes modelos ao final do seu ciclo de vida e não os substituir. Evitando também os gastos necessários para pôr todos os motores a cumprir a norma EU7. O investimento passa todo para a Cupra, que assim ocupa o lugar da Seat.

Cupra está em grande

Se dúvidas houvesse acerca desta mudança, ficaram dissipadas na recente apresentação de três novos modelos da Cupra para lançar exatamente nos próximos três anos.

São eles o SUV 100% elétrico Tavascan, agendado para 2024, o utilitário Urban Rebel, para 2025 e a novidade Terramar, um SUV derivado do Audi Q5 Sportback que estará à venda em 2024 e será o último modelo com motores de combustão que a Cupra vai lançar.

A primeira razão para a mudança foi admitida pelo CEO, Wayne Griffiths

As razões para o fim da Seat, como marca de automóveis e a subida da Cupra como protagonista são várias e fáceis de compreender. A primeira foi admitida de uma forma bastante clara por Wayne Griffiths.

As razões do fim da Seat

Segundo o CEO da Seat/Cupra, falando em termos de lucros: “por cada Formentor vendido, temos que vender quatro Ibiza.”

Mesmo descontando o fato de os dois modelos pertencerem a segmentos de mercado muito diferentes, a verdade é que o mercado está disposto a pagar mais por um Cupra que por um Seat.

Como disse o CEO do Grupo VW, Herbert Diess, há pouco tempo: “Os Seat têm que ser mais baratos que os VW, mas os produtos têm custos semelhantes, por isso não há margem de manobra.”

Formentor foi ponto de viragem

A Cupra foi lançada em 2018 como uma sub-marca da Seat, usando os mesmo modelos de base, mas posicionados num patamar de preço mais alto, justificado pelo foco nas motorizações mais potentes.

Mas o lançamento do Formentor, que esteve para ter também uma versão Seat, veio mudar tudo isso. O modelo foi um sucesso de vendas, para uma marca que está a começar. Em 2021 já foi o modelo mais vendido do grupo Seat/Cupra.

Em quatro anos de vidas, o Formentor é o modelo mais vendido da Cupra, com metade das 200 000 unidades entregues da nova marca.

Seat/Cupra: a nódoa de 2021

Mesmo assim, isso não impediu que o grupo das duas marcas espanholas fosse o único, dentro do Grupo VW, a dar prejuízo em 2021. Uma nódoa numa folha que fechou as contas acima do esperado, em relação a todas as outras marcas.

A Cupra triplicou as vendas de 2020 para 2021 e vai duplicar em 2022

Uma nódoa que será apagada pela Cupra, olhando para os resultados da marca. Em 2021, triplicou as vendas face a 2020, atingindo as 79 300 unidades e para 2022, as previsões são de duplicar esse valor.

Segundo Griffiths, “a médio prazo, as vendas da Cupra vão atingir as 500 000 unidades por ano” com alguns observadores espanhóis a identificar 2025 como a barreira para atingir esse valor.

Cupra tem maior potencial

Por isso me parece que 2025 será a data perfeita para o Grupo VW pôr um ponto final na Seat. Mas o grupo alemão ainda não confirmou, claro.

Note-se que, em 2021, as vendas da Seat e da Cupra somadas não passaram das 391 200 unidades, numa quebra de 2,0% face ao ano anterior. Por aqui se vê o potencial da Cupra.

Mais ainda quando a marca anuncia que a margem operativa da Cupra será de 5%, muito acima do que alguma vez seria possível com a Seat.

É o cenário perfeito. Não só a Cupra tem o potencial de vender carros mais caros que a Seat, como de vender mais. Por isso não admira que se olhe para outros mercados, onde a Seat nunca esteve presente.

Cupra nos EUA?

A Cupra poderia ser a marca ideal para o mercado dos EUA. Desde logo porque a sua presença no México não tem passado totalmente despercebida mais a Norte. Por outro lado, a VW continua a sofrer com os efeitos do escândalo “Dieselgate” nos EUA, enquanto a Cupra tem a “ficha limpa”.

Nos mercados novos em que a Cupra entrar, o plano é começar logo com vendas digitais diretas, o que aumenta ainda mais a margem de lucro.

Entre 2021 e 2022, é esperada uma subida na faturação da Cupra de 2200 milhões para 5000 milhões e isto é apenas o princípio.

Segundo dados dos primeiros meses deste ano, a percentagem de modelos Cupra nas vendas acumuladas da Seat/Cupra foi já de 24,5%, com o Formentor a liderar.

“Cupra é o futuro” e a Seat?

Griffiths diz que “a Cupra não é o fim da Seat, mas o futuro da companhia” acrescentando que “o futuro é elétrico e o futuro é a Cupra.” Uma conclusão óbvia, pois a questão da margem de lucro frágil dos Seat toma proporções ainda mais difíceis quando falamos de elétricos.

Alguns colegas jornalistas de Espanha acham que a Seat pode vir a ser a Dacia do grupo VW

Mas então qual o futuro da marca Seat? Alguns colegas jornalistas espanhóis consideram que a Seat poderá vir a ser a Dacia do grupo VW. Seria uma grande ironia, depois de anos a querer fazer da Seat a Alfa Romeo do grupo.

Outros acham que o futuro poderá estar na deslocalização da produção dos atuais modelos a gasolina e gasóleo, para continentes onde as normas não sejam tão apertadas e tão urgentes como na Europa.

Há também quem considere que a marca se poderá resumir à Seat Mó, virada para a micro-mobilidade, com os seus veículos de duas rodas elétricos.

Estratégia elétrica

Na minha opinião, e sem ter acesso a informação privilegiada, parece-me que o Grupo VW não tem muito a ganhar em apostar em algum dos dois primeiros cenários.

O foco atual da empresa é a eletrificação e Hebert Diess já disse que o objetivo do grupo é “ser o primeiro produtor mundial de veículos elétricos”.

Diess não deixou de reafirmar aquilo que já sabemos sobre a estratégia do grupo e que se aplica perfeitamente à Cupra: “o lucro é mais importante do que o volume”, uma descoberta que muitos outros também fizeram, depois da pandemia, da crise dos “chips” e da guerra.

“Hub” elétrico em Espanha

O futuro da marca fundada em 1950 e comprada pelo Grupo VW em 1986 deverá estar naquilo a que vários dirigentes já se referem como a “Seat Martorell”. Ou seja, o nome do “hub” elétrico que o grupo VW vai desenvolver em Espanha.

Este “hub” é centrado na produção de veículos elétricos do segmento B, portanto abaixo do ID.3, usando uma versão simplificada da sua plataforma, a MEB-Entry.

As duas fábricas do grupo VW em Espanha já estão a ser reconvertidas para a produção destes modelos, que vão ter no VW ID.2, no Cupra Urban Rebel e num modelo da Skoda os primeiros lançamentos.

A Seat nunca teve uma gama tão variada, tão bem desenhada e de tanta qualidade como agora

É um investimento da Volkswagen em Espanha que passa também pela construção de uma fábrica de baterias para veículos elétricos.

Nas últimas semanas testei vários modelos da Seat e confirmei aquilo que já sabia, que a marca nunca teve uma gama tão variada, tão bem desenhada e de tão elevada qualidade. Mas isso parece não chegar, nos dias que correm.

Conclusão

Neste cenário, talvez a micro-mobilidade faça sentido permanecer sob a marca Seat, mas não acredito que isso dure muito tempo. Na minha opinião, o mais provável, a médio prazo, é que a “Seat Martorell” passe a ser uma marca semelhante à nossa Autoeuropa. Mas com um potencial muito maior, infelizmente para nós.

Francisco Mota

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