11/11/2022. Finalmente, foi anunciada esta semana a nova norma Euro 7, de anti-poluição para automóveis. É mais importante para a saúde pública do que a luta contra o CO2, mas parece que ninguém ficou contente. Afinal, o que está aqui verdadeiramente em causa?

 

A luta contra a emissão de CO2 e os seus efeitos é mais do que conhecida. Uma luta global que abrange a generalidade dos setores da atividade humana e na qual os transportes rodoviários têm a sua quota parte de responsabilidade. É uma luta que vai durar décadas, por mais que alguns queiram fazer crer que se resolve em poucos anos.

Outra questão diferente é a da poluição do ar nas cidades, no qual a responsabilidade dos automóveis e dos transportes rodoviários é muito maior e de efeito direto.

É sabido que os NOx (óxidos de azoto) e as partículas de fuligem que são lançadas para o ar das cidades pelos tubos de escape dos automóveis e outros veículos com motor a combustão são a principal causa da poluição nas cidades.

Poluição que mata

Uma poluição que tem efeitos bem conhecidos das autoridades de saúde: os óxidos de azoto provocam danos no aparelho respiratório, causando ou agravando infeções pulmonares, asma e podendo levar a doença crónica dos pulmões que pode chegar ao cancro e aos problemas cardíacos.

A Comissão Europeia estima em 300 000 por ano as mortes relacionadas com a poluição das cidades

Este tipo de doenças já escalou ao primeiro lugar das mais comuns na Europa, com a Comissão Europeia a estimar em 300 000 por ano as mortes relacionadas com a poluição das cidades, na Europa dos 27. É a principal área de despesa dos serviços de saúde pública nos estados sociais europeus. Nada disto é novo.

As normas Euro “X”

A União Europeia desde há décadas que vem regulando as emissões poluentes dos automóveis e outros transportes rodoviários, para reduzir o impacte na saúde pública. São as chamadas normas Euro “X”, em que o “X” já vai no 6 e chegou esta semana ao 7, as normas Euro 7, ou EU7.

Este novo pacote de normas EU7 demorou mais tempo a chegar do que estava previsto, o atraso esteve relacionado com a pressão da indústria automóvel, numa altura que a União Europeia também já determinou o fim dos motores a combustão para 2035.

Os novos limites são iguais para todo o tipo de veículos e para todos os combustíveis, é uma das novidades da EU7.

São normas que obrigam a baixar as emissões de NOx dos motores Diesel em 25%, de 80 para 60 miligramas/quilómetro, ficando ao mesmo nível do exigido aos motores a gasolina. Os novos limites são iguais para todo o tipo de veículos e para todos os combustíveis, é uma das novidades da EU7.

Mais substâncias controladas

Também as emissões de partículas de fuligem vão ter que ser reduzidas, tal como o monóxido de carbono, hidrocarbonetos, metano, amónia e formaldeído, além do óxido de azoto e das partículas ultra finas. Passam a ser legisladas as emissões de partículas de borracha, pelo desgaste dos pneus, e de partículas de pastilhas de travão.

Estudos recentes mostraram que as duas últimas são igualmente prejudiciais para o sistema respiratório e as normas relativas a pneus e travões vão ser aplicadas também aos automóveis elétricos, como é lógico.

Os efeitos até 2035

A União Europeia diz que, com a EU7, as emissões de NOx vão ser reduzidas em um terço, até 2035. O que é importante, pois, apesar de não se poderem vender carros a combustão a partir dessa data, a Comissão Europeia estima que, em 2050, 20% dos ligeiros a circular ainda vai ter motor de combustão e 50% no caso dos pesados.

Por isso, a EU7 prevê que todos os veículos a combustão tenham que cumprir os limites durante a sua vida útil, num total de 200 000 km ou 10 anos, o dobro do que acontecia com a EU6.

Devido à EU7, a redução de NOx em 2035 será de 35% nos ligeiros e de 56%, nos pesados

A comissão europeia estima que, devido à EU7, a redução de NOx em 2035 seja de 35% nos ligeiros e de 56%, nos pesados. E que as partículas desçam 13%, para os ligeiros e 39%, para os pesados.

Todos os testes vão ser feitos de forma mais representativa da realidade, recorrendo aos protocolos RDE – Real Driving Emissions.

Construtores não gostaram

Os construtores de automóveis reagiram mal, dizendo que o dinheiro que vão ter que gastar para adaptar os atuais motores cumpridores da norma EU6, para a norma EU7, lhes vai fazer falta para desenvolver os veículos elétricos.

Dizem até que a EU7 poderá levar alguns à falência, antes sequer de se chegar à era elétrica.

Claro que algumas associações ambientais já vieram dizer o oposto, que as normas EU7 são uma desilusão, são fracas e tardias. Note-se que a entrada em vigor da EU7 está proposta para Julho de 2025, para ligeiros e Julho de 2027, para pesados.

Quanto vai custar ao consumidor?

A indústria diz que são prazos muito curtos, impossíveis de cumprir e que vão levar muitas empresas, incluindo fornecedores a situações limite, com despedimentos e falências.

Adaptar os veículos para cumprir as normas EU7 vai fazer subir o preço final de cada automóvel entre 80 a 150 euros

Pelo contrário, as contas da comissão europeia dizem que adaptar os veículos para cumprir as normas EU7 vai fazer subir o preço final de cada automóvel entre 80 a 150 euros e de cada pesado em 2700 euros.

Quem tem razão?

Na minha opinião, estamos a assistir a mais uma “guerra” entre a política e o lóbi da indústria automóvel. Só que, desta vez, não me parece que a indústria tenha muitas razões para se queixar, até porque, ao que se sabe, a União Europeia preparava-se para fazer uma EU7 bem mais severa do que a versão final.

Compreendo que os construtores tenham que investir já nos veículos elétricos, para estarem prontos para a proibição dos motores a combustão em 2035. Mas a realidade é que estamos em 2022, ainda faltam 13 anos, nos quais se estima que sejam vendidos 100 milhões de veículos a combustão novos na Europa.

13 anos é muito tempo

Em 13 anos, muitos milhares de habitantes das cidades vão ter problemas respiratórios graves, causados pela poluição dos automóveis e outros transportes rodoviários. É urgente que a União Europeia tome medidas para reduzir as emissões poluentes que podem ser fatais.

Não se pode congelar a luta contra as emissões poluentes nocivas durante 13 anos

A indústria automóvel não pode querer que se congele a luta contra as emissões poluentes nocivas durante 13 anos, só porque lhe convém, em termos de orçamento para investir nos elétricos do futuro.

Claro que ainda estamos a falar de uma proposta, que terá de ser aprovada pelo parlamento europeu e pelo conselho europeu. No entanto, não me parece que venha a sofrer grandes alterações, pois faz parte do chamado “Geen Deal” que visa o combate às emissões poluentes de veículos rodoviários na Europa.

Conclusão

A indústria automóvel está a fazer o seu papel, em todo este processo, mas talvez esteja a levar a um extremo inaceitável a racionalização e, em última instância, o lucro, em detrimento da saúde pública de muitos dos que são os consumidores dos seus produtos.

Francisco Mota

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