Fontes geralmente (muito) bem informadas da Alemanha, dizem que o grupo VW está a pensar vender as suas marcas de luxo. O que ganha, o que perde e porquê vender agora?…

 

O líder histórico do grupo Volkswagen, Ferdinand Piëch, talvez o mais influente de toda a indústria, resolveu montar uma boutique de luxo com marcas de sonho, para completar o seu negócio de vender “carros do povo”.

É verdade que comprou marcas que, nos anos noventa, estavam em dificuldades, como a Bentley, a Lamborghini e a Bugatti.

E também comprou a Italdesign e a Ducatti. Não foi o custo da compra dos emblemas que causou mossa no orçamento.

Mas os investimentos que foram sendo feitos em cada uma destas marcas de luxo, isso já foi outra história.

Observadores bem informados afirmam que a Bugatti nunca teve lucro, considerando os custos de desenvolvimento.

Bentley e Lamborghini salvas pelos SUV

A Bentley teve um sobe e desce no seu gráfico de lucro ao longo dos “anos VW”, que ora deixava um sorriso nos lábios do enigmático Piëch, como o deixava verdadeiramente irado e mudava o CEO.

O SUV Bentayga veio trazer alguma estabilidade e acaba de receber um restyling para se proteger da concorrência.

A Lamborghini, também só depois do lançamento do SUV Urus começou a ter pretensões de ser mais do que uma excentricidade do grupo, tecnologicamente associada à Audi, para ver se reduzia os custos de desenvolvimento e produção.

Piëch morre e tudo muda

Entretanto, Piëch foi afastado da liderança do grupo em 2015 e morre subitamente a seguir a um jantar com a sua esposa num restaurante perto de sua casa, no ano passado.

Não se pode dizer que tenha sido o afastamento e morte de Piëch a fazer despoletar, na administração do grupo, a ideia de vender as marcas de luxo. Mas ajudou.

A vaidade de alguém que tinha conhecido os tempos difíceis da VW nos anos setenta e que conseguiu operar a reviravolta, era exacerbada com a posse de marcas de sonho. Os seus “brinquedos”.

Mas os novos administradores, certamente menos carismáticos, mais pragmáticos e mais pressionáveis pelos accionistas, não se deixam levar por sentimentos desse tipo.

Os dramas do grupo VW

A verdade é que o grupo VW passou (e ainda está a passar…) pelo gigantesco problema do Dieselgate, que lhe custou 30 mil milhões de euros em indemnizações e ainda poderá custar mais.

Logo a seguir, veio o enorme investimento do grupo nos modelos elétricos e na digitalização, num total estimado em mais de 60 mil milhões de euros.

Depois veio a Covid-19 e praticamente parou tudo durante quatro meses, arruinando um ano que até tinha começado bem para as marcas de luxo. Está por avaliar quanto terá custado a pandemia à VW, porque ainda não parou.

Razões para vender

Só pelo dinheiro, já se percebe que vender as marcas de luxo seria uma decisão mais do que lógica. Em conjunto, estão avaliadas em 16 mil milhões de euros.

É claro que a venda das marcas de luxo não iria compensar as despesas que a VW está a ter. Mas davam uma ajuda e davam mais alguma coisa.

A eletrificação é um problema para as marcas grandes, mas é ainda maior para as pequenas. E se está a pensar que a Tesla é uma exceção, não é: nunca deu lucro, até agora.

Por mais sinergias que se possam fazer, e o grupo VW é mestre neste assunto, a verdade é que, quando se fala de marcas com a imagem e a história da Bentley, Lamborghini e Bugatti, não se pode exagerar. Caso contrário, corre-se o risco de descaracterizar os seus modelos.

Luxo e elétrico, funciona?

Os custos e a demora de fazer a eletrificação certa destas marcas é mais um investimento de grande volume, com um retorno muito duvidoso.

Ninguém sabe como vão reagir os clientes destas marcas face à proposta de modelos 100% elétricos.

Se, muitas vezes, não têm paciência para esperar pela encomenda do seu carro, vão ter para esperar que as, necessariamente enormes, baterias dos seus carros carreguem?

A Covid-19 trouxe a crise económica mas não só. Pode ter trazido também uma mudança na relação das pessoas com os automóveis, a todos os níveis de preço. Aquilo que era o sonho de muitos, pode deixar de o ser, de um momento para o outro.

Marcas jurássicas?

Quem quer ser insultado na rua, enquanto conduz um milionário modelo da Lamborghini, Bentley ou Bugatti? – “Esses dinossauros sorvedores de petróleo que poluem tudo à sua passagem.”

Por tudo isto, a ideia de vender as suas marcas de luxo, faz cada vez mais sentido. A questão é saber se há quem as queira comprar.

Um qualquer grupo chinês, à procura de acrescentar vaidade ao seu portefólio? Pode ser uma hipótese, se tiver mais dinheiro que juízo.

Ou os investidores árabes, para controlarem a produção dos brinquedos de que são grandes consumidores?

Seja como for, negócios como este não se fazem entregando a chave da fábrica e recebendo um saco cheio de notas.

Ninguém compra se não tiver a garantia de acordos de cooperação técnica com a VW, pelos menos durante alguns anos. E será que a VW está disposta a isso?

Conclusão

Se não aparecerem compradores, a outra hipótese é deixar as marcas morrer. Fechar a torneira, deixar de investir, redimensionar para não gastar mais dinheiro. Até que o último cliente leve o último carro, para se fechar a porta assim que ele virar costas. O que não falta são casos destes na história da indústria automóvel.

Francisco Mota

Para percorrer a galeria de imagens, clicar nas setas

Ler também seguindo este LINK:

Morreu Ferdinand Piëch: “o déspota brilhante”