6/11/2020. As notícias de que a Tesla vende créditos de carbono a marcas que não cumprem os limites de poluição são conhecidas. Mas, este esquema de transação de certificados de emissões, está a tornar-se num negócio com benefícios duvidosos para o planeta.

 

Tudo começou pelas intenções dos vários Estados que participaram em iniciativas como o protocolo de Kyoto ou os acordos de Paris. Reuniões de bem intencionados que queriam resolver o problema do aquecimento global, lutando contra os gases que o geram, com o dióxido de carbono (CO2) à cabeça.

Nem todos os países assinaram esses tratados, nem todos os cumprem, apesar de haver estudos a garantir que um quinto de todas as emissões de CO2 têm origem no transporte terrestre. Mas há sempre outros estudos a dizer o contrário.

A ideia dos créditos de carbono não é recente mas tem ganho força nos últimos anos, desde que começaram a apertar as limitações às emissões dos gases de efeito de estufa.

Em 2015, o limite para a média da gama de veículos de passageiros de cada marca era de 130 g/km de CO2. Em 2020, esse valor baixou para 95 g/km de CO2. Uma descida que poucos construtores de automóveis conseguiram acompanhar.

Isso deixa-os à mercê das multas instituídas, nomeadamente, pela UE. É bom notar que a lei não é universal, nem sequer dentro de cada pais: nos EUA há diferentes metas em diferentes Estados, alguns nem sequer as têm…

Créditos de carbono: como funcionam?

O conceito dos créditos de carbono é muito simples: cada empresa recebe um limite de toneladas de CO2 que pode emitir por ano, com base na média da sua atividade. No caso da indústria automóvel, a média é calculada com base nos automóveis com motores de combustão.

As marcas que ficarem abaixo do seu limite, recebem créditos, que podem guardar para descontar nos anos seguintes, ou simplesmente vender a outras marcas. Um crédito equivale a uma tonelada de CO2. O seu preço varia com a mesma lógica da Bolsa, na eterna lei da oferta e da procura. Em 2018, foram transacionados a uma média de 16 dólares, cada.

A ideia, virtuosa, era incentivar os construtores a tomar medidas para reduzir as suas emissões, seja tornando a fabricação e utilização dos automóveis mais eficiente; seja partindo para novas tecnologias, como os carros elétricos.

O negócio que nasceu

Tornar os créditos em certificados transacionáveis permitia duas coisas. Por um lado, dar a quem os vende uma fonte de financiamento extra, que só pode aplicar para desenvolver ainda mais a mobilidade sustentada. Por outro lado, permitir a quem os compra evitar pagar multas, ganhando tempo enquanto desenvolve novas tecnologias mais “limpas”.

A realidade do mercado dos créditos de carbono entrou contudo por uma lógica puramente economicista. Quem compra, toma essa decisão apenas por ser mais barato do que pagar multas e investir em carros elétricos, que têm ainda um mercado muito pequeno.

A perversão do princípio fica assim bem clara. As marcas que investiram no aumento da eficiência dos seus automóveis, casos da Toyota, Honda, Nissan, Mitsubishi e Tesla, são premiadas com os proveitos da venda dos créditos.

Mas as marcas que os compram, e que são muitas, entre as quais as que menos problemas têm em falar disso são a GM, FCA e Ford, estão a perder, duplamente. O dinheiro que estão a gastar nos créditos não o estão a investir no desenvolvimento de novas tecnologias que as levem a conseguir cumprir as metas.

E quem paga é…

Ou seja, os modelos mais poluidores, continuam a poluir mais e a ser vendidos. Mas está tudo bem, porque compraram os créditos. O planeta não está a receber menos poluição, mas a letra da lei está a ser cumprida. Que irónico!…

Quem acaba por pagar tudo é o consumidor, como era de esperar. Os construtores que compram créditos de carbono acabam por passar esse custo para o preço dos carros que vendem. E quem compra carros elétricos também está a pagar, pois são mais caros que os outros.

Os contribuintes também pagam esta transferência energética e de duas formas. Por um lado, através dos incentivos fiscais que são dados aos fabricantes que desenvolvem carros mais eficientes e sustentáveis. Por outro lado, nos descontos oferecidos aos consumidores que têm capacidade de comprar um carro elétrico, que estão muito longe de ser a maioria.

Conclusão

Pensar que esta é uma fase transitória e que o mercado acabará por regular tudo, pode ser uma atitude demasiado otimista. Algumas marcas admitem que não vão investir em carros elétricos enquanto não existir uma procura realmente significativa. São as mesmas marcas que estimam em trinta anos a efetiva passagem para os elétricos. Por isso, preferem as multas ou os créditos a fazer carros que lhes dão prejuízo. Não é de admirar que haja quem defenda o fim deste esquema, cujos benefícios para o planeta são mais que duvidosos.

Francisco Mota

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