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21/03/2020: Nos livros de história da indústria automóvel, sempre olhei para o episódio da participação no esforço de guerra durante a segunda grande guerra como algo de verdadeiramente impressionante. A história repete-se.

 

De um dia para o outro, uma marca que fabricava automóveis, passava a fabricar carros de combate ou armas ou o que fosse preciso. E isso aconteceu um pouco por toda a Europa.

A capacidade de adaptação da indústria automóvel a novas exigências, por vezes completamente inesperadas, já vem de longe.

A dinâmica desta indústria não tem paralelo noutras áreas “pesadas”. O ambiente de numerosa e fortíssima concorrência em que opera, obriga todos os atores a ter uma atitude pro-ativa e inventiva.

Conseguir propor um produto mais competitivo do que as outras marcas suas concorrentes faz parte do seu dia-a-dia.

A “bagagem” de fazer carros

Para isso, é preciso imaginação na conceção e destreza na fabricação. Mas não só. É preciso também obedecer a um caderno de encargos, ou seja, atingir os objetivos cumprindo escrupulosamente os orçamentos.

É preciso poder negocial para conseguir “espremer” os fornecedores, não só em termos de preços como de qualidade e inovação.

Colocá-los em competição uns contra os outros é algo que só os grupos muito grandes conseguem provocar e daí tirar proveitos.

Depois, é preciso a agilidade de um felino para navegar num mar de burocracias e fazer a logística parecer fácil.

Fazer um carro num continente e vendê-lo noutro, a milhares de quilómetros de distância, sem atrasos, sem danos na mercadoria despachada e sem enganos na especificação que o cliente escolheu. Nenhuma outra indústria tem esta agilidade.

O esforço de guerra

Por isso não espanta que seja precisamente a indústria automóvel a liderar mais uma vez a participação no esforço de guerra por que passa o planeta neste momento.

Agora a guerra (sem aspas) é contra o Covid-19 e as armas de que os hospitais precisam são ventiladores, para assistir os doentes em estado grave.

Para quem está habituado a fabricar produtos com mais de cinco mil peças, oriundas dos fornecedores mais diversos, fabricar um mero ventilador de hospital é um desafio fácil.

Fácil para esta indústria, claro. As grande marcas já deram o exemplo e já estão em campo a preparar-se para ocupar o espaço e os trabalhadores que pararam a produção automóvel devido à pandemia.

Dos carros aos ventiladores

Em vez de carros, das linhas de montagem vão sair ventiladores, e rapidamente, que o vírus não dá tréguas.

A americana General Motors já se juntou à Ventec, a maior produtora deste tipo de equipamento, para aprender como se fabricam ventiladores e arrancar o mais rapidamente possível.

A Ford Motor Company acompanhou o processo e até a Tesla também já encara essa hipótese.

Talvez os americanos tenham acordado tarde para a dimensão da pandemia, mas sabemos como se conseguem mobilizar rapidamente e combater qualquer inimigo da maneira mais mortífera que se possa imaginar. Este caso não será exceção, estou convencido.

Europa vai à frente

Na Europa, também já se trabalha a todo o vapor para produzir ventiladores. A Volkswagen disponibilizou o seu parque de 125 sofisticadas impressoras 3D para começar a fabricar ventiladores o mais depressa possível.

A experiência da marca nesta área já vem de longe e passa pela fábrica Autoeuropa de Portugal, que usa este método para fabricação de ferramentas necessárias à montagem dos seus carros.

A VW já tem uma “task-force” a trabalhar 24 horas por dia com empresas do setor para definir um caderno de encargos e produzir os “blueprints” do primeiro protótipo, necessários para começar a fabricar.

A Skoda vai participar com as suas ágeis fábricas neste projeto, a Bentley já pediu para ser envolvida também e a Porsche vai a fundo na área da ajuda humanitária.

Grupo VW não está sozinho

Como sempre, o Grupo VW não brinca em serviço, sendo acompanhada pela BMW, que já disponibilizou o seu “know-how” também na área das impressoras 3D.

Em Itália, onde a situação é muito grave, a FCA e a Ferrari já estão a trabalhar com a Siare, o fabricante local especializado em ventiladores, para começar a sua produção com urgência.

Também no Reino Unido a Nissan se uniu à McLaren para o desenvolvimento ultra-rápido de um inovador protótipo de ventilador de emergência, que já está em fase de testes.

Conclusão

Ao apelo dos vários governos nacionais, os construtores de automóveis responderam “presente!” e empenharam-se na fabricação das “armas” de que os soldados da saúde mais necessitam, nos seus violentos cenários de guerra. A história repete-se, com outros atores, outros instrumentos mas a mesma vontade de combate.

Francisco Mota

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