21/10/2022. Enquanto alguns países da Sul da Europa “estendem passadeiras vermelhas” aos construtores chineses, Carlos Tavares, o CEO português do grupo Stellantis, defende maiores taxas à importação de elétricos “made in China”.

 

Esta semana, Carlos Tavares, o CEO português do grupo Stellantis, o quinto maior do mundo, que agrupa marcas como a Peugeot, Jeep, Alfa Romeo e mais onze emblemas, falou sobre a fortíssima ofensiva que os construtores chineses estão a fazer na Europa.

Segundo Tavares, a Europa está a “estender uma passadeira vermelha” aos construtores chineses, que poderá prejudicar os construtores europeus. Tavares não teme a concorrência dos chineses, desde que seja em pé de igualdade.

Tavares disse que, enquanto as marcas chinesas pagam taxas de exportação para a Europa de 10%, as marcas europeias pagam entre 15 a 20% para exportar para a China. “Tem que existir uma paridade de tratamento,” disse o português.

Macron diz que sim…

O assunto foi tema de conversa com o presidente Macron, durante o Salão de Paris, com o político a responder que uma alteração ao acordo de comércio entre a China e a União Europeia teria que ser tratado ao nível europeu.

Macron defende uma reforma nas taxas aos automóveis elétricos, favorecendo os que forem fabricados em França e na Europa, numa tomada de posição que segue os planos que foram anunciados no mesmo sentido em relação ao mercado dos EUA.

Não há unanimidade

Mas a unanimidade em torno deste assunto pode não ser fácil de alcançar. As marcas alemãs têm investido muito no mercado interno chinês nos últimos 15 anos, fazendo crescer o peso dos seus resultados na China no seu negócio global.

Um aumento de taxas de importação de automóveis “made in China” para a Europa, poderia ser visto como uma provocação às entidades chinesas, que levaria inevitavelmente a retaliações às marcas ocidentais que operam na China.

Tanto mais que o desempenho das marcas estrangeiras na China tem estado a descer nos últimos tempos. Com o aumento de qualidade dos produtos fabricados pelas marca locais, os compradores deixaram de ter razão para comprar produtos de marcas estrangeiras.

Joint-ventures coercivas

Recorde-se que, quando as marcas ocidentais começaram a entrar na China, só o podiam fazer através de “joint-ventures” coercivas com grupos industriais locais, quase sempre liderados por organismos estatais.

Passada uma década e meia, parece que as marcas locais que se associaram às ocidentais já aprenderam o suficiente para dominar a produção automóvel e estão a caminho da Europa. Como aliás ficou patente na sua forte presença no salão de Paris.

Tavares diz que, com taxas tão baixas, as marcas chinesas podem até entrar nos mercados europeus a perder dinheiro, com preços abaixo dos custos de produção, para ganhar quota de mercado e, mais tarde, subir preços para o valor de mercado.

Fábricas chinesas na Europa

No entanto, a resposta à entrada da marcas chinesas na Europa pode ser ainda mais complicada do que parece. Segundo os líderes da BYD, um dos maiores grupos chineses, pode estar em hipótese a instalação de fábricas chinesas na Europa.

Essa notícia terá já levado alguns países do “Sul da Europa” a propor condições muito vantajosas para a instalação dessas fábricas nos seus países, captando o investimento chinês. Os homens da BYD disseram mesmo que “nem na China temos condições tão vantajosas.”

Mais uma vez, aumentar as taxas de importação de automóveis para a Europa, poderia pôr em risco esse hipotético investimento dos chineses na Europa, muito desejado por alguns políticos europeus.

Stellantis sai da China?

Por outro lado, Tavares disse que está em hipótese a retirada da presença da Stellantis na China, afirmando que “não tenho a certeza que seja necessário ter fábricas na China”.

Alguns observadores dizem que se trata de uma reação ao fecho da fábrica chinesa da Stellantis/GAC que produzia modelos da Jeep para o mercado local. O fecho terá tido como origem interferências do governo chinês.

Numa fase de transição para a eletrificação, que se anuncia tudo menos tranquila, a Stellantis já confirmou que vai duplicar a sua quota de veículos elétricos fabricados na Europa.

Até 2024, terá 12 veículos elétricos em produção em cinco fábricas francesas, o que deixou o ministro das finanças, Bruno Le Maire, satisfeito, depois de ter afirmado que o Estado (accionista da Stellantis e do Group Renault) esperava que as marcas francesas mantivessem a produção no país, na transição para a eletrificação.

Conclusão

Esta “invasão” chinesa da Europa é algo que se encarava como inevitável, sobretudo tendo em conta as condições proporcionadas pelos políticos europeus. Mais uma vez, Carlos Tavares, pôs o dedo na ferida de mais um assunto que pode causar sérias dificuldades à indústria automóvel europeia, com tudo o que isso significa em termos sociais.

Francisco Mota

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