22/05/2020 – O ministro das finanças de França diz que a Renault pode “desaparecer” se não for ajudada imediatamente. Mas as ajudas só avançam mediante algumas condições…

 

Ao fim de dez anos de lucros, a Renault fechou 2019 com prejuízos. O problema, portanto, não é a Covid-19, já vem de trás.

A novela da prisão de Carlos Goshn terá sido o gatilho que fez disparar a bala. Não porque Goshn fosse insubstituível, outros há que poderiam fazer tão bem ou melhor o seu trabalho.

Não sei se será o caso da “estrela” Luca De Meo, o novo CEO da Renault “comprado” à Seat naquilo a que se pode considerar a “transferência do ano”, ao jeito do futebol.

Mas Goshn mantinha um equilíbrio delicado entre a Renault e a Nissan, geria muito bem a confiança entre os franceses e os japoneses.

Até ao dia em que adicionou a Mitsubishi à aliança e começou a falar em “fusão”, uma palavra maldita para os japoneses, que se viam ameaçados no seu estatuto de “grandes administradores”.

O que se seguiu, era o esperado, fora a cena da sua fuga “à 007” que continua mal explicada.

Quebra nas sinergias

A diminuição das sinergias entre a Renault e a Nissan começaram a surgir e os planos para o futuro em comum são cada vez mais raros.

A Renault já precisava de uma nova direção desde o ano passado, a Covid-19 só veio agravar a situação e torná-la mais urgente.

O ministro das finanças de França diz que a Renault pode “desaparecer” se não for ajudada de imediato. A ajuda está autorizada pelos poderes europeus, mas ainda não chegou.

O ministro quer garantias, como todos os ministros das finanças querem neste momento. Não é só na TAP que o dinheiro entra contra maior “controlo” por parte do Estado.

A Renault já precisava de uma nova estratégia, que até já tinha sido mais ou menos desenhada: fecho de fábricas, despedimentos e corte na oferta de modelos menos rentáveis.

Espace, Scenic, Talisman e… Alpine!

Neste último capítulo, já tinha sido anunciada uma aposta ainda mais forte nos SUV e crossovers, tirando do catálogo modelos históricos, mas hoje pouco rentáveis, como o Talisman, Scécnic e até a Espace.

Lançada em 1984, a mãe de todos os monovolumes, foi produzida em mais de 1,3 milhões até agora, mas a atual quinta geração está a agonizar: em 2019 vendeu 9500 unidades, descendo 20% face ao ano anterior.

O Scenic, outro modelo pioneiro que deu origem a um novo segmento, também não está melhor, com quebras de 16% em 2019.

Os cortes da Renault podem passar até pelo inimaginável cancelamento de todo o programa Alpine. O desportivo em alumínio feito em Dieppe seria uma vítima do fecho da histórica fábrica da Renault Sport. Que futuro para o Mégane RS ou o futuro Clio RS?…

Demasiados modelos

A realidade é que, entre as marcas do grupo Renault, onde se incluem a Dacia, Samsung e Lada, existem nada menos do que 45 modelos diferentes. É preciso cortar para metade, admite a marca.

Mas enquanto os cortes forem em modelos, o ministro não tem grande preocupação. O caso muda de figura quando se fala em fechar fábricas da Renault em França, claro.

Na sua mais recente entrevista, o ministro diz que “não se pode” fechar a fábrica de Flins, perto de Paris e se deve fazer o mínimo de despedimentos em solo francês.

Não é que isto traga algo de muito novo, mas é curioso ver como a hipótese de fechar fábricas na China, ou noutros países é vista com outro à vontade.

Em França?… Não!

O ministro não acha admissível estar a “dar” ajudas à Renault e, ao mesmo tempo, serem fechadas fábricas do construtor em França, lançando operários para o fundo de desemprego.

Diz que, em vez disso, “devem ser aumentadas as sinergias com a Nissan”, como se isso fosse algo que se faça da manhã para a tarde.

Mas diz mais. Numa tendência que se começa a generalizar nesta fase pós-confinamento, começa a falar-se que esta é uma boa oportunidade para os construtores de automóveis acelerarem a transferência para os elétricos.

Chamar a isto irrealista será fazer um elogio a quem acha que, no meio da maior crise dos últimos cem anos, é a altura de gastar mais dinheiro em carros que só 1% da população tem dinheiro para comprar. Mas é uma das condições para as ajudas à Renault.

Conclusão

O ministro foi mais longe e disse que o dinheiro (5 mil milhões de euros) só é entregue à Renault se o grupo garantir que vai sediar o desenvolvimento de novas tecnologias em França; e se se comprometer a trazer de volta as fábricas de automóveis para França. Se isto não é chantagem….

Francisco Mota

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