26/07/2019 A rede de abastecimento pública de veículos elétricos está numa “situação insustentável” diz a associação dos utilizadores. É o que acontece, quando se começa a construir a casa pelo telhado…

 

O manifesto da Associação de Utilizadores de Veículos Elétricos (UVE) mais parece um pré-aviso de greve, o que não deixaria de ter a sua graça…

Diz a UVE que a rede pública de postos de carregamento de veículos elétricos é insuficiente, não é fiável, está degradada, não lhe é feita a manutenção, parte dela está desligada e outra parte à espera de ser instalada. Não é coisa pouca!

De quem é a culpa? Do governo, claro!… Foi o ministro da tutela que disse em 2016 que cada sede de conselho iria ter “pelo menos” um posto de carregamento e que “o Estado tinha de contribuir” para essa obra.

Pelos vistos, não contribuiu e não foi por o ministro ter mudado de ideias em relação aos elétricos, que defende de maneira por vezes questionável.

Não há dinheiro…

O problema, é fácil de adivinhar, é o dinheiro. Num país como o nosso, a verdade é que o problema é sempre o dinheiro, o dinheiro dos contribuintes, o “nosso” dinheiro.

Não chega para tudo. Para as obras de fachada há sempre orçamento, para outras empreitadas falta sempre.

Para rasgar os passeios com ciclovias que ninguém usa, há dinheiro, para investir numa rede de carregadores, já não há. E isto para ficar só no tema da mobilidade.

Elétricos pouco democráticos

Mas, mesmo que houvesse dinheiro, seria sempre o nosso dinheiro a pagar a rede de carregadores para veículos elétricos.

O dinheiro dos impostos de quem tem um carro elétrico e o dinheiro dos impostos de quem se arrasta num carro a gasóleo com vinte-e-tal anos, numa qualquer localidade esquecida do Interior, onde os únicos carregadores que existem são os dos telemóveis. Como diz Carlos Tavares, o líder da PSA: “os elétricos são pouco democráticos”.

Por que razão tem que ser o Estado a “contribuir” para a instalação da rede de carregadores elétricos? Sobretudo se não o faz bem.

A UVE também se queixa disso quando acusa o governo de ainda não ter concessionado alguns desses postos. Resta saber se há interessados.
O edifício da transição energética começou a ser feito pelo telhado, isso é mais que óbvio.

Começar pelo telhado

Antes de serem criadas as condições para que a rede de carregamento crescesse, optou-se pela propaganda ao carro elétrico como a cura de todos os males. Agora começam a haver carros elétricos a circular e não há rede para os alimentar. E ainda agora começámos.

Segundo a UVE, o parque circulante de automóveis elétricos em Portugal vai nos 12 000 unidades. Uma pequeníssima percentagem do total de 4,8 milhões de carros que circulam no nosso país, mas o suficiente para já haver problemas.

Segundo dados da Mobi.e, existem 1250 pontos de carregamento público em Portugal. Mas se formos ao seu site, está lá uma estatística que indica terem sido utilizados 998 pontos, desde 2010.

Fazendo as contas por baixo, neste momento haverá um ponto de carga para cada 10 carros elétricos, o que até está mais ou menos alinhado com as aspirações europeias.

Mas isso seria contar que esses postos estão a funcionar bem e ainda teriamos que somar os híbridos “plug-in” que também precisam de ser carregados.

Mais carregadores rápidos

Parte do problema poderia ser resolvida com mais postos de carga rápida, mas só há 63, nem todos estão a funcionar e a sua localização é tudo menos acessível.

Mas a UVE não se queixa só disso e levanta duas outras questões relevantes, pelas quais eu já passei durante os mais recentes testes que fiz a alguns carros elétricos.

Pagamento e faturação são uma dor de cabeça

Trata-se do processo de pagamento e faturação da energia elétrica, que se começou a pagar a partir do ano passado, depois de um período de transição longo em que tudo era “à borla”.

Se nunca fez a experiência, fique a saber que não pode pagar a energia no posto de carregamento, nem com dinheiro, nem com cartão de crédito.

A única maneira de o fazer é requisitar antecipadamente o seu cartão individual de mobilidade elétrica. Só com este cartão, emitido por um dos fornecedores de energia elétrica do país, poderá aceder a um carregador público.

A UVE queixa-se também da falta de transparência no pagamento, pois no final, quando desliga o carro do posto de carga, não recebe a informação de quanto vai pagar.

Apenas quando receber em casa a fatura da eletricidade, ficará a saber quanto pagou. Isto porque o total a pagar inclui várias taxas, fixas e variáveis, que mudam de posto para posto, de acordo com a empresa que o está a explorar. Não é simples.

Conclusão

No meio desta confusão toda, que me parece só terá tendência a piorar, confesso que começo a perceber os passeios que alguns condutores de modelos da Tesla fazem, traçando roteiros de “visita” aos supercarregadores que a marca americana já instalou no nosso país. Para já, são só seis, com um total de 52 pontos de carregamento, mas funcionam, por isso até merecem reverência.
Francisco Mota

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