22/11/2019. A Califórnia tem a imagem de uma grande preocupação com a poluição automóvel. Mas, como em todo o lado, a verdade dos políticos nem sempre é a da rua.

 

Depois de ter passado alguns dias a “viver” em Los Angeles, alojado num hotel da “baixa” local, ficaram-me dois sons nos ouvidos: as sirenes dos veículos policiais e o rugido de carros superdesportivos.

A frequência de ambos, ao longo do dia, é muito superior ao que estava à espera. E se o primeiro poderá ser mais um sinal de problemas de criminalidade e de questões sociais, de que os inúmeros sem abrigo a viver nas ruas são a maior evidência, já o segundo quer dizer outra coisa.

A força da Califórnia

O Estado da Califórnia tem a fama de ser uma das regiões do mundo em que existe maior preocupação com a poluição automóvel.

Desde há muitos anos que tem estado na liderança das medidas para reduzir um problema que atinge quarenta milhões de pessoas que aí vivem.

A dimensão económica deste Estado dos EUA é tão grande que representaria a quinta economia do mundo, se fosse independente. Isto dá-lhe uma força notável, quando toca a fazer leis estaduais.

Neste momento, existe mesmo uma disputa entre o Estado da Califórnia e o governo federal, acerca do aumento das exigências em termos de normas de poluição que os automóveis vão ter que cumprir no futuro próximo.

“Apertar” com as emissões

A Califórnia quer diminuir ainda mais os limites, mas o governo federal acha isso um exagero.

É conhecida a posição da atual administração federal acerca deste assunto, várias vezes verbalizada pelo presidente dos EUA, por isso esta disputa não é de estranhar.

Mas daí a dizer que os cidadãos da Califórnia são mais sensíveis ao assunto do que os seus compatriotas de outras latitudes, vai uma grande distância.

Muitos Prius nas ruas

É verdade que a venda de modelos como o Toyota Prius é muito grande, basta parar uns minutos numa das ruas para os ver passar.

Mas não diria que passam menos “pick-ups”, ou SUV de grande porte, ou as mais vulgares berlinas do segmento D, que ainda continuam a ser a maioria.

A sensibilidade da população para o problema só chega até ao ponto em que isso colide com o seu interesse particular, como em todo o lado.

Por isso o som de superdesportivos a “puxar” primeiras e segundas velocidades assim que o semáforo passa a verde, é um cenário muito comum. E quanto mais alto for o ruído do escape, melhor para quem os conduz.

Se há nação em que o “som” da mecânica é mais importante do que a performance, propriamente dita, parace ser este.

Riqueza sobre rodas

A quantidade de desportivos e superdesportivos que se podem ver e ouvir a qualquer hora do dia ou da noite, é espantosa, sendo a prova do sucesso que estes carros continuam a ter por aqui. E da riqueza de uma parte da população.

Ao contrário do que se passa em algumas cidades da Europa, em que começa a ser socialmente criticável fazer subir o som de um motor a gasolina, em Los Angeles nada disso se passa.

Claro que o Estado da Califórnia, como outros dos EUA, tem um problema muito maior, que é a falta de um controle para os carros usados. Sem inspeções periódicas obrigatórias, é virtualmente impossível controlar a degradação da poluição nos modelos mais velhos.

Elétricos, onde estão?

Por isso, a questão da eletrificação do automóvel parece ficar muito mais pelos gabinetes dos políticos do que propriamente na consciência da população compradora de automóveis.

É claro que o tempo das enormes “banheiras” americanas, como lhes chamávamos por cá, já acabou há muito tempo.

Mas as vendas de “pick-up trucks” de tamanho americano, uma escala acima das que se vendem na Europa, não deixa de crescer e de dominar o mercado.

O “carro” mais vendido no país ainda continua a ser a “pick-up” Ford F150, o suficiente para ser também um dos mais vendidos no mundo, feitas as contas globais.

O Salão de LA mostrou a realidade

Isso mesmo estava refletido no Salão Automóvel de Los Angeles, onde pude apreciar a oferta completa de “pick-ups” de todas as marcas, não só das generalistas Ford e Chevrolet, mas também das especializadas como a RAM ou a GMC.

Entre os SUV, de todos os tamanhos e feitios, e a generosa oferta de “pick-up trucks” o mercado parece não se interessar demasiado pelos carro elétricos.

Nas conferências de imprensa dos salões do automóvel na Europa, os discursos dos CEO das marcas não podem deixar de incluir uma referência ao seu plano de lançamento de modelos eletrificados no futuro próximo.

Nas conferências que ouvi no Salão de Los Angeles a preocupação é mostrar que as vendas de veículos convencionais continuam a crescer, que as fábricas produzem cada vez mais e empregam mais operários.

Conclusão

No meio deste cenário, o lançamento do Mustang Mach-E, o SUV elétrico que a Ford aponta como rival do futuro Tesla Model Y, pareceu uma gota de água no Oceano.

Bastava olhar para o espaço da marca no salão para perceber isso: em torno do Mach-E estavam todas as versões mais potentes do Mustang coupé, as inevitáveis “pick-up trucks” e os gigantescos SUV.
Eletrificação, sim. Mas, vamos com calma…

Francisco Mota

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