Algumas marcas passam a ideia que os carros autónomos estão quase a chegar. Mas quem estuda o assunto diz que estamos muito longe. Saiba qual é o problema.

 

O cenário é muitas vezes publicitado por algumas marcas de automóveis (e não só) e é assim: o proprietário do carro abre a porta, senta-se, diz ao carro onde quer ir e os computadores de bordo tratam do resto.

Enquanto isso, o ex-condutor pode gastar o tempo a ler o jornal ou, mais provavelmente, a olhar para o smartphone, agora de forma legal.

Nem precisa de por o cinto de segurança, porque os carros autónomos, controlados pela inteligência artificial, todos conectados entre si e com as infraestruturas rodoviárias, não vão ter acidentes.

Esta imagem do futuro é promovida por “concept-cars” que algumas marcas mostram nos salões automóveis internacionais, veículos com uma morfologia completamente diferente dos que temos hoje e que, como todas as “visões” dos engenheiros formados em marketing são “o futuro”.

Mas esta realidade está muito mais longe do que se poderia pensar, ouvindo alguns dos especialistas que trabalham na condução autónoma há vários anos.

Fazer base de dados

O trabalho de desenvolvimento da condução autónoma tem sido feito partindo da ideia de que os computadores têm que armazenar todas as situações que um carro a circular possa encontrar. Só que ninguém sabe quantos zeros poderá ter esse número.

A pesquisa tem sido dividida em duas áreas, as simulações em computador e os testes reais, havendo quem critique ambos os métodos. Mas já lá vamos.

Alguns especialistas dizem que 80% das situações possíveis já foram identificadas e transformadas em modelos informáticos que os computadores podem entender.

Mas, dizem os mesmos estudiosos, os 20% que falta vão se os mais difíceis. Vão ser precisas muitas horas de simulação para chegar a um ponto em que os carros autónomos sejam 99,9% de confiança, em todas as situações. Para lá chegar, vão ser precisos mais 50 anos, dizem.

Quais os obstáculos?

Os obstáculos são muitos, a começar pela convivência entre carros autónomos e tudo o resto que circula na via pública, sem ser controlado por um computador: peões, ciclistas, animais e os outros carros que não são autónomos.

Um destes especialistas disse-me que uma das situações mais difíceis de modular é quando um cão persegue um gato: é impossível saber para que lado se dirigem, ou se ficam apenas a correr em círculos.

Outro entendido diz que os sensores têm dificuldade em interpretar roupa com diferentes texturas.

Um acidente fatal já ocorreu

E depois há o caso do teste feito nos EUA em que um carro autónomo, em testes na via pública, não conseguiu identificar uma ciclista na via pública. O acidente aconteceu e a ciclista passou à história como a primeira vítima mortal de um carro autónomo.

Este caso levantou outra questão, para lá da incompetência da informática em identificar um ciclista.

Como é óbvio e de lei, o carro autónomo em testes circulava com um condutor de emergência a bordo. Um engenheiro que tem por missão pegar no volante e tomar conta dos acontecimentos quando algo acontece ao sistema autónomo.

Nível 4 pode não ser viável

Ter o condutor pronto a intervir em caso de falha é um dos preceitos para o nível 4 da condução autónoma. Mas que se está a revelar demasiado perigoso.

A prática está a mostrar que, quando o sistema de condução autónoma não consegue “perceber” uma situação e decide entregar o controlo da situação ao condutor, já é demasiado tarde.

Um condutor que não vai a conduzir, nunca estará num estado de alerta suficiente para ser ele a resolver uma situação que o computador não conseguiu. Nem o computador lhe passa os comandos com antecipação suficiente. Foi isso que aconteceu no acidente fatal com a ciclistas dos EUA.

Testes em via pública: à espera do acidente

Os testes na via pública, devidamente autorizados, estão a ser criticados por serem demasiado perigosos: “quem os faz, está apenas à espera que o acidente aconteça” disse há pouco tempo Michael DeKort, engenheiro da SAE (Sociedade da Engenheiros da área Automóvel) e membro da “task force” sobre condução autónoma.

E a explicação é realmente preocupante: “só com acidentes é possível fazer avançar a condução autónoma, pois é nesses casos que surgem as situações novas” acrescentou o engenheiro americano.

Estaremos dispostos a testemunhar mais acidentes fatais como o da ciclista americana, para fazer evoluir a condução autónoma?

Simulação de nível aeronáutico

O mesmo especialista, que trabalhou da Defesa Norte-Americana e na área da simulação aeronáutica, diz que a solução está na simulação em computador, “mas usando simuladores derivados dos empregues na aviação e não nos que seguem a lógica dos jogos de vídeo”, como ele diz serem os usados pelas empresas que estão a fazer testes reais de condução autónoma.

Cinco níveis de automação

A SAE estabeleceu há vários anos os cinco níveis em que se divide a condução autónoma. O nível 1 são as primeiras ajudas eletrónicas à condução, que começaram a aparecer os automóveis novos há algum tempo.

Os níveis 2 e 3 têm sucessivamente mais ajudas eletrónicas à condução e o nível 4 é o primeiro “sem mãos”.

O nível 5 é a condução sem intervenção do ex-condutor. Quando  SAE definiu esta escala, tudo parecia mais fácil. A confiança nas simulações em computador era maior e ainda não se tinha chegado à conclusão que, o futuro próximo dos carros autónomos passa pela sua segregação no espaço público.

Conclusão

Para começar, os carros completamente autónomos, os de nível 5, só vão ser seguros em vias de circulação vedadas a qualquer outro tipo de veículos, peões ou animais.

Para já, os estudiosos do assunto garantem que não há confiança suficiente no sistema e que vão ser precisos mais 50 anos. E isto sem falar nos custos da tecnologia. O futuro, neste caso, não parece está ao virar da esquina.

Francisco Mota

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