12/04/2019. A partir de 2022, todos os carros novos vão ter um sistema que limita a velocidade de acordo com os limites locais. Chama-se ISA e vai controlar o seu comportamento ao volante. Quer saber como?…

“Com campanhas de sensibilização não se consegue convencer os condutores a reduzir a velocidade, é preciso impedir que o possam fazer.” Esta conclusão da autoridade japonesa para a segurança rodoviária, data do início dos anos oitenta, quando todos os construtores locais concordaram em limitar a velocidade máxima dos seus carros, à venda no mercado doméstico, aos 180 km/h.

Se isto lhe faz lembrar o recente anúncio da Volvo, de que vai fazer o mesmo a todos os seus carros produzidos a partir de 2020, já sabe de onde veio a ideia.

Em 1989, a mesma autoridade japonesa chegou a limitar a potência de todos os carros à venda aos 280 cv, sempre com a segurança como objetivo. Mas a verdade é que o Nissan 300ZX, lançado nesse mesmo ano, era um dos carros mais potentes à venda e tinha… 280 cv.

Com a escalada de potência dos rivais internacionais, os construtores japoneses começaram a fazer pressão para acabar com esta lei, até que, em 2004, a lei da potência máxima foi mesmo abolida: “não há relação entre a potência e as mortes na estrada” concluía a autoridade para a segurança. Irónico, não é?…

ISA vai chegar

Vem isto a propósito da recente aprovação pela comissão europeia da imposição de um novo sistema que limita a velocidade dos automóveis automaticamente, de acordo com os limites em cada local.

A aprovação indica 2022 como a data para a entrada em vigor deste sistema, mas ainda falta a aprovação final do parlamento europeu, o que só pode acontecer após as eleições de Maio próximo. No entanto, é improvável que a decisão seja invertida.

O sistema em causa chama-se ISA, as iniciais de Intelligent Speed Assistance, e será obrigatório em todos os carros à venda a partir dessa data, sejam caros ou baratos.

Como funciona?

O funcionamento é relativamente simples e utiliza ferramentas que já existem em muitos automóveis. Através do GPS, o sistema determina a estrada que o carro está a percorrer e consulta um mapa digital, que indica a velocidade máxima nesse local. A informação é cruzada com aquela que vem da câmara de vídeo do carro, que faz o reconhecimento dos sinais de trânsito.

A partir daqui, o sistema avisa o condutor acerca do limite de velocidade local e, se ele estiver a rodar acima dessa velocidade e não travar, será a própria ISA a fazer diminuir a potência do motor, até o carro baixar à velocidade autorizada. O condutor sente o carro a perder potência e a baixar a velocidade, sem ter feito nada para isso acontecer.

Até já há ISAs…

Na verdade, já há alguns construtores que oferecem esta função, associada ao limite de velocidade do Cruise Control adaptativo. Mas a ideia da ISA é estar presente e em operação em todos os carros, a todo o momento, sem possibilidade de ser desligada.

Apenas em situações limite, como em ultrapassagens, cruzamentos ou entradas em autoestradas, o condutor poderá superar o limite de velocidade, carregando no acelerador até ao fundo. Mas isso só poderá acontecer durante alguns segundos de cada vez. Falta definir quantos segundos.

ACEA está contra

Na verdade, falta definir muita coisa. A ACEA, a associação europeia dos construtores de automóveis já veio dizer que a data de 2022 é precoce. Por três motivos essenciais: os mapas digitais de limites de velocidade nas estradas da Europa não está atualizados, nem são coerentes, de país para país.

Depois, há muita sinalização contraditória nas estradas e alguns sinais não estão visíveis, obstruídos por vegetação ou por outros sinais. A ACEA diz que, primeiro, as autoridades devem tratar da infraestrutura, só depois devem impor aos construtores a inclusão de novos equipamentos. Que vão aumentar os custos de produção, faltou dizer a associação.

500 mortes por semana

Segundo dados da comissão europeia, nas estradas do Velho Continente, morrem todas as semanas 500 pessoas em acidentes de trânsito causados por velocidade excessiva. São 25 000 mortes por ano na Europa…

A mesma fonte afirma que 30% de todas as fatalidades rodoviárias têm origem no excesso de velocidade, se bem que aqui poderia começar a eterna discussão da causa de um acidente. Quem já alguma vez tenha estado envolvido num, sabe que é quase sempre a causa que o agente policial prefere preencher, seja em Portugal, ou noutro país qualquer.

Mas o facto é que morre gente, muita gente, porque outra gente decide conduzir mais depressa do que devia. A comissão europeia admite que o consumo de álcool e as distrações do condutor (vulgo ir a mexer no smartphone) também são causas importantes, mas não se consegue combater tudo de uma vez e a velocidade é sempre o mais fácil.

Segundo dados oficiais, 60% dos condutores admite exceder a velocidade regularmente e muitos confessam que só se apercebem disso quando são multados, o que é ainda mais grave.

ISA e os amigos

A ISA não virá sozinha, contudo. A fazer-lhe companhia, estarão os sistemas de manutenção de faixa de rodagem e a travagem de emergência com reconhecimento de peões e ciclistas.

A comissão europeia diz que a ISA terá também o efeito de encorajar a utilização das bicicletas e de andar a pé, pelo acréscimo de segurança que traz, o que parece já um pouco panfletário.

Também discutíveis são outros efeitos secundários benéficos da ISA, como a chamada “acalmia” do trânsito, a redução dos preços dos seguros, a redução dos consumos e das emissões.

Redução de 20% nas mortes

Mesmo que tudo isto seja muito otimista, mas que as projeções de redução de 30% no número de colisões e de 20% no número de fatalidades sejam mais ou menos atingidas, já será um grande progresso. Tão grande que alguns comparam a ISA com a obrigatoriedade de utilização do cinto de segurança.

E a caixa negra?…

Falta acrescentar um “pequenino” detalhe, que é a fiscalização. Ao lado da ISA, está prevista a montagem de uma caixa negra, inspirada nas dos aviões. O seu papel será o de gravar todos os dados imediatamente antes e após o acidente, para tratamento posterior. Aqui abre-se a caixa de Pandora da proteção de dados, um tema tão complexo que merece outra Crónica à 6ª Feira.

Conclusão

Se pensava que vão ser os carros autónomos a roubar a sua liberdade ao volante, mas apenas daqui a uma década, lamento dar-lhe a notícia de que isso vai acontecer muito mais cedo e de forma muito mais limitadora. A ISA vai controlar e limitar o seu comportamento ao volante, porque a política pensa que os condutores não o sabem fazer por eles próprios. O problema é que, desta vez, a política é capaz de ter razão.

Francisco Mota

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